Les Chansons d'Amour. França, 2007, 100 minutos. drama musical. Diretor: Christoph Honoré.
A obra transita de modo poético entre as relações amorosas passíveis de acontecer a qualquer pessoa e inevitavelmente encantam o espectador.
A obra transita de modo poético entre as relações amorosas passíveis de acontecer a qualquer pessoa e inevitavelmente encantam o espectador.
Antes de começar a escrever sobre o filme, devo fazer um agradecimento à Jacqueline (@jactardezinha, no Twitter), que me recomendou o filme e emprestou-o para mim. Como ela é uma profunda admiradora do Louis Garrel, sempre comenta sobre alguns de seus filmes e eu acabo conferindo alguns – como foi o caso desse.
Não conheço muito da filmografia de Christoph Honoré, diretor desse filme, mas pelo pouco que vi, sei que ele é um diretor polêmico. Suas escolhas abordam temas delicados, que podem chocar a parcela conservadora da sociedade. Para exemplificar o quão polêmico ele é, nem preciso citar Minha Mãe, que fala sobre uma mãe que se torna tutora sexual do próprio filho. Posso usar Les Chansons D’Amour. Ao discorrer a respeito das possibilidades do amor e das diferentes maneiras como ele se concretiza, o diretor assume uma posição contrária ao pensamento convencional, que é aquele que define relação amorosa como envolvimento entre um homem e uma mulher.
Fugindo desse paradigma social, somos apresentados ao ménage a trois vivido por Ismael, Alice e Julie. Os três estão envolvidos num relacionamento que é tempestuoso às vezes, mas decididamente é embasado pelo amor e pela segurança, permitindo-os assim continuar juntos, mesmo que o relacionamento deles não seja o mais comum na sociedade. O conflito surge com a morte de Julie, o que provoca uma série de questionamentos por parte de Ismael e de Alice e também da família de Julie.
Alice, Julie e Ismael: três personagens que formam um casal.
O filme como exercício cinematográfico funciona muito bem, mas não creio que o seu maior mérito esteja inserido em suas cenas. Elas se tornam um instrumento para atingir o público e o grande destaque do filme está no modo como ele consegue transmitir pensamentos mais amplos às pessoas que o vêem. Numa das cenas, Julie conversa com a sua mãe acerca do relacionamento que tem com Ismael e Alice – ela discorre a respeito de como é estar com duas pessoas na cama, mas em momento nenhum reduz a relação apenas ao sexo. De certa forma, isso serve para mostrar ao público que relações como a deles não se limita ao âmbito sexual, mas também é passível de um envolvimento afetivo e amoroso. Com a morte de Julie, Ismael entra num estado de afastamento da vida social; depois de dormir na casa de um amigo de Alice, que parece interessado nele, Ismael percebe a chance de o amor reacontecer nos braços de Erwann. Então, pouco a pouco, ele se envolve num relacionamento com o rapaz, fazendo com que o público perceba que o amor definitivamente pode acontecer de outro modo.
Vale ressaltar que a força do filme está na gentileza com a qual Honoré o filmou. Em nenhum momento a película choca o espectador, que consegue ser transportado com eficiência para o universo psicológico de Ismael, personagem central. As dores dele são compartilhadas com quem vê o filme, então nós acabamos muito próximos do personagem. As canções de amor citadas que dão título ao filme servem para conduzir o espectador no mundo melodioso das relações pelas quais Ismael passa e as letras das canções servem para que nós possamos compreender um pouco do que significa cada momento para ele. Quando está com Julie e Alice, uma canção revela a dependência que há entre esses personagens, sendo Alice a ponte sobre o riacho que leva Ismael a Julie. Desse modo, percebemos a conexão que há entre eles, nos permitindo compreender que a terceira pessoa é o elemento de estabilidade. Mais tarde, depois que Julie morre, Ismael e Alice cantam juntos uma música na qual falam sobre calar-se e beijar-se, numa amostra de que estão presentes neles a tentativa de reprimir o sentimento de dor com o ato do afeto. Depois, quando Ismael por fim se envolve emocionalmente com Erwann, ela inicia a canção com “lava a minha memória suja por esse rio de lama”, numa referência às suas lembranças que foram deturpadas pela dor; diz também “minha cama parece um bloco de gelo que derrete quando você me abraça”, aludindo à forma purificada como agora ele encara o amor que sente por Erwann. Não penso que seja válido analisar Les Chansons d’Amour apenas com uma perspectiva cinematográfica, haja vista que bosta parte do filme está inserida no universo literário da composição artística no que diz respeito à linguagem – assim, atentar para as letras das canções é fundamental para uma compreensão mais apurada do que o romance tem para mostrar.
Grégoire Leprince -Ringuet e Louis Garrel protagonizam cenas poéticas, embaladas pela relação vivida pelos seus personagens, que acabam se envolvendo eventualmente e acabam apaixonados.
Não me restam dúvidas de que o destaque do filme é Louis Garrel, que está presente num dos filmes de que eu mais gosto: Os Sonhadores. Decerto sua presença é a que mais chama atenção, até porque a história toda gira em torno de seu personagem. Gosto da segurança que esse ator passa ao atuar e nunca me senti incomodado com alguma de suas atuações. Como Ismael, ele nos apresenta mais uma boa performance, que é muito elogiável. Todos os outros atores estão muito bem em cena, mesmo aqueles cujas funções são secundárias se mostram exemplares. Sem exageros em nenhum das interpretações, creio que Canções de Amor seja um dos filmes que conquistam o espectador também pela veracidade das expressões e sentimentos mostrados.
Considerando todos os aspectos do filme, desde a composição cinematográfica até o passeio literário que nos é permitido por intermédio das letras muito bem elaboradas, esse filme musical me conquistou de um jeito muito interessante. À primeira vista, parece um filme simples – e de fato é. Mas uma análise mais densa nos coloca diante de uma obra séria e densa, de proporções maiores do que aquelas que os nossos olhos enxergam quando o vimos pela primeira vez. Recomendá-lo é o mínimo que eu posso fazer, pois decerto é uma das boas obras de Honoré e também dos atores em cena. Não posso terminar sem dizer que o tema todo do filme é muito bem aproveitado, de modo que vê-lo é um prazer.
2 opiniões:
Depois que vi "Ma Mère", da dupla Garrel + Honoré, perdi qualquer vontade de ver um filme deles. Primeiro porque o filme é péssimo e incrivelmente pretensioso. Segundo porque acho Honoré um cara superestimado mesmo =) O longa dele que mais gostei foi "Em Paris", e bem moderadamente...
Há tempos que uma querida amiga, Gabriela Brahim, me diz para ver esse filme, mas sempre adio - até porque nunca acho com qualidade boa pra baixar. Do Christoph Honoré, eu vi A Bela Junie, que é um dos filmes mais bobos e insossos dos últimos tempos - fiquei feliz quando a Junie é derrubada de um prédio em Missão Impossível 4. Acho o Louis Garrel um cheira peido também. Bonito? Sim. Talentoso? Ao meu ver, não. Acho inexpressivo e antipático. Mesmo assim, verei, um dia, As Canções de Amor sem preconceitos!
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