A Home at the End of the World. EUA, 2004, 96 minutos, drama. Diretor: Michael Mayer.
Incrível como bons livros resultam em obras muito medianas. Inúmeros pontos tornam o filme bem menor do que ele poderia ter sido - um deles é Colin Farell.
O que me motivou a assistir a esse filme foi a obra literária que lhe deu origem. Uma Casa no Fim do Mundo – e conseqüentemente A Casa do Fim do Mundo – fala sobre o começo da amizade entre Bobby e Jonathan na década de 70 e sobre como ela foi se transformando, até chegarem à idade adulta, nos anos 80. Em meio a isso, há o problema de Bobby com a morte de sua família, um relacionamento homossexual entre os personagens principais e a relação a três com Clare, mulher mais velha, que acaba apaixonada pelos dois.
É curioso notar que o autor do livro é também o roteirista desse filme. Anteriormente, ele havia escrito o romance As Horas, que originou o excelente filme protagonizado por Nicole Kidman em 2002; dois anos depois, em 2004, ele assinou o roteiro que transformaria em filme outro livro seu. Não sei bem o que houve, mas se eu fosse adaptar essa obra, em específica, eu tomaria cuidados notáveis e tentaria manter aquilo que há de mais elogiável no romance: mais de um protagonista e narrativa em primeira pessoa. O personagem central dessa produção é Bobby, garoto que teve problemas na infância, decorrentes da perda do irmão num trágico acidente doméstico, da mãe em conseqüência da tristeza pelo filho perdido e, mais tarde, do pai, que se afundou em solidão com a quebra do vínculo familiar.
Bobby, já adolescente e viciado em drogas – que lhe foram apresentadas pelo irmão –, conhece Jonathan na escola e rapidamente se tornam amigos: logo ele está freqüentando a casa de Jon, jantando com a família dele, dormindo na casa dele e, por fim, descobrindo-se atraídos sexualmente. O grande problema do roteiro é que isso tudo é mostrado de forma muito rápida e acabamos não tendo tempo pra entender os personagens. Jonathan e Bobby parecem adolescentes solitários e desajustados em relação a todos ao seu redor, mas isso não é mostrado como motivo fundamental para a aproximação entre eles. De desconhecido a acolhido pela família de Jon, Bobby parece não ter qualquer desenvolvimento. A relação maternal que Alice, mãe de Jon, nutre por Bobby é requentada no filme: falta carinho, falta amor mesmo. Eu não tive certeza se a personagem de Sissy Spacek aceitou Bobby em sua casa por pena dele, por ele ser amigo do filho ou porque lhe queria o bem. Mais tarde, quando Bobby se muda para o apartamento de Jon e de Clare, esses dois parecem desconhecidos e mesmo depois de algum tempo, eles ainda não parecem ter afinidade suficiente. Os três se apaixonam, se relacionam, e eu fiquei me perguntando: como pessoas tão desconhecidas conseguem isso? Michael Cunningham tratou seus personagens superficialmente e tornou qualquer situação pela qual eles passam muito simples, sem possibilidades de sugerir ao espectador algum questionamento. Seu roteiro é suave demais.
Vale ressaltar que o livro tem quatro protagonistas: Jon, Bobby, Clare e Alice. No filme, ao enfocar Bobby, os outros se tornam coadjuvantes, mas mesmo assim Michael Cunningham tentou colocar um pouco da história de cada um desse personagens na história e isso resultou em cenas bem desalojadas, como aquela em que Alice conversa com Clare, aquela em que Ned avisa Bobby que ele e Alice vão para o Arizona e que não há mais espaço pra ele e inclusive a saída repentina de Jon do triângulo amoroso em que os três personagens vivem. Essas cenas parecem meio soltas na história, como se fossem irrelevantes, como se não houvesse um motivo mais profundo para que cada um desses eventos ocorressem.
Os atores, em minha opinião, constituem outro erro. Não sei quem achou que Colin Farrell poderia encontrar em si mesmo o tom necessário para a grandeza de Bobby. Ele me soou muito equivocado na maior parte das cenas; a sua insistência em falar baixo e mole, para criar o tom distraído de Bobby me irritou. Dallas Roberts transformou Jonathan em outro equívoco – seu personagem não tem problemas sentimentais, ele parece apenas uma drama Queen. Gosta de choramingar, de reclamar, de se fazer de vítima – e isso não se deve ao roteiro simplório, que tenta mostrar muito numa estrutura muito limitada. A sua interpretação provavelmente provém do fato de que Jonathan é exclusivamente gay, então o ator resolveu falar com os punhos quebrados e ficar com a língua presa em alguns momentos. Isso para não falar da gesticulação excessiva em algumas cenas. Robin Wright Penn não tem espaço na obra, sua personagem não tem desenvolvimento nem a atriz pode destacar-se. Cabe a ela poucos momentos e somente na sua antepenúltima cena é que podemos vê-la se esforçando para aparecer: a expressão da atriz enquanto a sua personagem vê os dois rapazes dançando na varanda é magnífica. O espectador atento poderá fazer uma retrospectiva mental e preencher os vazios que o filme tem a partir do momento em que a observa constatar que, embora eles sejam três, o amor reside em apenas dois, sempre dois. Sissy Spacek, em minha opinião, está linda. Fisicamente, eu digo, porque a sua personagem sofre do mesmo problema de Clare – não tem qualquer desenvolvimento. Mas, ainda assim, ela é a melhor de todos – rouba a cena, em todos os momentos. Uma pena que o diretor tenha desperdiçado justamente o melhor nome desse elenco!
Aqueles que leram o livro previamente sentirão pontadas de felicidade ao perceber que os diálogos se mantiveram. Podemos reconhecer a maioria das passagens literárias, desde Bobby dizendo “Por que sente muito? Você nem a conhecia” para Alice, quando ela diz sentir muito pelo garoto ter perdido a mãe até quando ela fala “Ei, garotos, que tal me dar uma carona?” – no momento extremamente tenso do livro e extremamente bobo no filme. E acho que as qualidades do filme sejam essa e a trilha sonora. Como Bobby é viciado em vinis, a trilha do filme acaba sendo boa e válida.
De resto, A Casa do Fim do Mundo é um filme comum, daqueles que eu considero “só mais um filme”. Se minha memória não fosse muito boa, eu decerto não me lembraria dessa obra daqui a dois meses. Achei-o superficial, creio que esse adjetivo resuma bem o que pensei do filme. Não é profundo, não é cuidadoso, não explora o suficiente. E o tipo de obra cinematográfica que não motiva o espectador a conhecer a obra literária – a não ser, evidentemente, que o espectador seja tão superficial que se surpreenda com o que essa produção mostra. Embora seja possível vê-lo tranquilamente, não vai sensibilizar ninguém, garanto.
3 opiniões:
O Michael Cunningham é um escritor fenomenal, mas, como roteiristas, não é grande coisa. "A Casa do Fim do Mundo", pelo menos pra mim, é um filme irregular e que desperdiça várias histórias boas...
Puxa! Dei uma passada de olho por aqui e vi tantos títulos que desconheço! Vou aparecer mais à procura de novas referências.
gostei de conheçer o blog!e eu gosto muito da Robin Wright desde que a vi no filme Forrest Gump o Contador de Historias! um abraço e sucesso!!Marcos Punch.
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