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7 de nov. de 2012

A Morte do Demônio

Evil Dead. EUA, 1981, 85 minutos, terror. Diretor: Sam Raimi.
Indubitavelmente, esse é um filme que faz jus à sua fama e que é facilmente um clássico do cinema trash – cada pequeno defeito é uma qualidade a mais e todos os seus erros constituem a sua perfeição!

Nem precisa chegar à cinefilia para conhecer a fama de Evil Dead. Trata-se de um filme do qual todos já ouviram falar, seja pelo seu título original, pelo seu título nacional ou, ainda, pelo seu protagonista, Ash, que é um dos líderes mais aclamados do cinema de terror. Essa produção B de Sam Raimi tornou-se memorável na história do cinema – poucos filmes são tão assustadoramente bons e conquistaram tantos fãs como esse, que gerou duas sequências – uma em 1987 e a outra em 1992 – e, de certo modo, se imortalizou.

Sam Raimi nos trouxe no início da década de 1980 um filme que chamaria atenção pela dose de violência e pelo impacto visual. É inegável que, antes mesmo de nos lembrarmos da história, nós nos lembramos dos personagens caracterizados como possuídos pelo demônio – ou demônios, na verdade, posto que cinco amigos que decidiram passar as férias numa cabana no meio da floresta os libertam ao ter acesso às páginas do Necronomicon, o Livro dos Mortos. O diretor Sam Raimi, que é também o roteirista, torna o seu filme – supostamente de terror – numa obra extremamente engraçada e é exatamente por isso que eu o considero uma obra “assustadoramente boa”, como disse acima. 
Ash, o herói do filme.

Primeiramente, eu gostaria de diferenciar os dois tipos de fãs e me posicionar em relação à minha postura diante deles. Acredito que haja aqueles que simplesmente gostam do filme porque tem medo dele e porque o consideram uma obra impecável, sem grandes defeitos. O outro grupo de fãs são aqueles que percebem os defeitos do filme e compreendem o seu uso como recurso de ironia e, analisando o filme todo, percebem que ele se constrói muito mais pelo hiperbólico do que pelo verossímil. Eu faço parte do segundo grupo de fãs e acho um absurdo o primeiro grupo: é impossível sentir medo dessa produção bem como é impossível não enxergar nela muitos erros – alguns dos quais muito grotescos – de modo a considerá-la uma das melhores filmagens do gênero terror. Até porque se enxergam essa obra com tal seriedade, seria difícil considerarmo-la como pertencente ao cinema trash.

Desde o início do filme percebemos o baixo orçamento. A qualidade da imagem é bastante precária, extremamente diferente de outros filmes produzidos na mesma época. Sam Raimi contava com pouco dinheiro e bastante criatividade e isso se evidencia no excesso de maquiagem (que também ocorreu por outros motivos, como, por exemplo, saída dos atores do filme, obrigando-o a disfarçar os dublês o máximo possível). De certo modo, penso que o filme seja capaz de provocar certa sensação de claustrofobia, mesmo que não se limite ao espaço físico da cabana. A exploração de áreas circunvizinhas é satisfatória para mostrar ao espectador que, embora eles tenham muito espaço, a sua área de atuação é mínima. Isso se evidencia no momento em que a primeira personagem é atacada – quase estuprada, pode-se dizer – na floresta e, curiosamente, pela própria floresta. Cada cena demonstra a precariedade do orçamento, por isso mesmo, até cenas simples, como algumas perseguições, são filmadas com notáveis defeitos.

 Olhem os olhos dela! Que será que aconteceu?

Eu realmente acredito que Sam Raimi escreveu seu roteiro visando criar – simultaneamente ao incômodo do gore – um efeito cômico, que provoca no espectador alguma descontração. Não penso que ele tenha querido de fato criar uma obra de terror; se quisesse, não teria, pois, teria exagerado em algumas cenas que enfatizam bastante o humor. Aproveito aqui para citar a primeira cena de possessão. Uma personagem, na frente de todos os outros, levita, profere ameaças com a voz absurdamente rouca, a sua pele se encontra putrefata, o seu corpo agitando-se numa posição muito incomum; logo depois, cai no chão, desmaiada. Ante o acontecimento, os personagens se questionam a respeito do que aconteceu ao olhos dela, que estavam revirados – como se achassem a levitação, por exemplo, bastante corriqueiro e como se não houvesse mais nada de assustador ou estranho na mulher possuída. É evidente que Raimi criou isso só como ironia, assim como inúmeros outros acontecimentos ao longo do filme, como distâncias incoerentes entre os personagens, aspectos físicos incomuns, entre outras coisas.

Confesso que eu ri demais ao rever Evil Dead. Eu havia me esquecido de como era bom estar diante de um filme tão precioso, tão bom apesar de sua baixa qualidade. Aliás, acredito que o adequado seria dizer “tão bom por causa da sua baixa qualidade”. A luta intensa de Ash por sobreviver é realmente interessante, principalmente porque ele vê todos os seus amigos e sua namorada morrerem no primeiro filme, permanece preso na mesma cabana (no dia seguinte) no segundo filme e, no terceiro, é enviado para a Idade Média, para combater os demônios que há muito tempo assolam a humanidade. Acredito que Ash é quase tão heróico quanto Sidney Prescott, da série cinematográfica Scream (1996-2011) – a diferença é que ela é mais interessante enquanto personagem psicológica e está numa série em que o nível de qualidade é mantido, em oposição à série Evil Dead, na qual percebemos uma crescente perda da qualidade, sendo o primeiro filme muito bom e o último filme sendo muito ruim (leiam: o primeiro diverte bastante enquanto o último é muito chato). Enfim, acredito que essa produção de Sam Raimi merece ser vista, ouso até dizer que ela merece ser apreciada em boa companhia, com uma boa cerveja e totalmente de mente aberta pro que tem de melhor em humor.

18 de abr. de 2012

Giselle


Gostaria de agradecer ao Marcelo pelo aceite ao meu convite e acrescento que me agrada tê-lo de volta em mais uma participação no meu blog, principalmente falando de um assunto que tanto lhe agrada: safadeza. Brincadeiras à parte, agradeço-o mesmo e, como de costume, espero mais participações.
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Brasil, 1980, 90 minutos, pornochanchada. Diretor: Victor di Mello.

por Marcelo Antunes

Não é raro, ao longo da história do cinema, filmes obscuros serem alçados ao status de cult. Vira e mexe, produções fora do mainstream caem no gosto de cinéfilos, mesmo sendo verdadeiros fracassos quando levados à tela grande. Guardadas as devidas proporções, evidente, este é o caso de “Giselle” (1980), produção do estúdio Vidya, dirigido por Victor de Mello e protagonizado pelo grande nome da pornochanchada, Carlo Mossy.

 Giselle, Ângelo e Haydée - o triângulo da trama.

O enredo conta a história de Giselle (Alba Valéria), filha do fazendeiro Luchinni (Nildo Parente) e enteada de Haydée (Maria Lúcia Dahl). De volta à casa paterna, depois de uma temporada de estudos na Europa, Giselle cai nas graças de madrasta, com quem mantém um caso amoroso. Entre as duas, está ele, o capataz-garanhão Ângelo; a terceira vértice do divertido triângulo. Triângulo, aliás, que não tarda a transformar-se em quadrilátero, com a chegada de Serginho, filho de Haydée. Ângelo traça todos. Aliás, algumas das cenas mais memoráveis do filme são justamente essas, que envolvem nossas personagens e suas peripécias sexuais. Como esquecer do estupro coletivo no meio da estrada? Parece bizarro, mas, depois do episódio, nossos amigos levantam-se, sacodem a poeira e vão todos à festa, para qual se encaminhavam anteriormente. Outra cena memorável é da briga na birosca, quando Ângelo, pra defender Serginho da chacota dos bebuns locais, mete-lhes a porrada, numa cena digna dos Irmãos Wachowski.

Vale destacar outras passagens: as cenas de sexo envolvendo Serginho, Giselle e
Ângelo; o discurso de uma antiga amante de Giselle, guerrilheira e engajada política, papel de Monique Lafond, com uma interpretação que chega a impressionar de tão ruim (o texto também não colabora, vai); insinuações de prática de pedofilia por parte do chefe da família e a cena de abertura, onde um cavalo cobre uma égua. Isso tudo regado por uma trilha sonora luxuosa, com clássicos como Let It Be e outras canções dos Beatles.

Resumindo: papa fina. E, desde sempre, um clássico.

8 de mar. de 2011

Gente como a Gente

Ordinary People. EUA, 1980, 124 minutos, drama. Diretor: Robert Redford.
Uma obra interessante que aborda a tensão familiar de modo pungente - só não se torna marcante porque o seu roteiro não consegue focar naquilo que é realmente desautomatizador.

Ordinary People foi a grande surpresa da cerimônia do Oscar no ano de 1981: venceu na categoria principal e ainda concedeu a Redford o prêmio de Melhor Diretor. Quando todos pensavam que o cultuado Touro Indomável, de Scorsese, fosse o grande filme da noite, esse filme sobre um drama familiar se torna o alvo dos holofotes.

Gente como a Gente tem uma história bastante simples. Uma família – pai, mãe e filho – tentam se recuperar da morte de um parente, o filho mais velho. A morte dele gera um conflito muito grande entre os três, fazendo-os se questionar sobre o relacionamento que têm e sobre a parcela de culpa de cada um. Embora estejam vivendo de modo tumultuado, tentam demonstrar que tudo está bem para os vizinhos e amigos da família.

Talvez o que tenha levado a Academia a se render e conceder-lhe o prêmio máximo – somado ao problema político que envolvia Touro Indomável – foi o modo incisivo como o roteiro aborda o drama pessoal de um jovem que se culpa pela morte do irmão mais velho. A intensidade da narrativa nesse ponto é tão grande que o espectador acaba inserido na história, como se fosse um personagem avulso, que observa de dentro e não de fora das telas. Não quero, com isso, dizer que acho que o roteiro desse filme seja o melhor drama familiar existente, nem de longe creio que ele seja realmente grandioso. Se por um lado a perspectiva e os problemas pelos quais Conrad passa, por outro lado o resto da família é praticamente ignorado. Tomemos como exemplo Beth, a mãe: sua personagem é extremamente interessante, parece amar demais a um filho a ponto de conceder a ele todo o amor que sente, sem restar nada para o marido e para o outro filho. Justamente com a morte daquele que ela ama, ela se torna inatingível – não chora, não ri, se distancia, parece estar constantemente enraivecida, embora consiga diminuir a aparência de sua expressão. Tudo o que poderia ser explorado ao seu respeito foi reduzido a poucos momentos, sendo que apenas um é grandioso o suficiente e, nessa passagem, ela nem sequer fala.

A direção de Robert Redford se intensifica quando o diretor consegue captar das cenas os seus melhores ângulos, e dos atores os seus melhores desempenhos. Assim, todos em cena estão bem corretos. Gosto do modo como Redford soube intercalar os protagonistas – a cada momento, um deles tem destaque, mesmo que Beth e Calvin, personagens de Mary Tyler Moore e Donald Sutherland, sejam pouco aproveitados pelo roteiro. A interpretação dos atores ajuda a nos fazer crer que aquilo seja mesmo real, até porque todos parecem realmente viver a tortura da perda. Timothy Hutton personifica Conrad com um cuidado muito intenso e isso resulta numa atuação realmente boa, tanto é que a Academia lhe premiou com a estatueta – o único problema foi tê-lo indicado na categoria errada, já que o personagem é visivelmente protagonista. Sutherland compôs um pai compreensivo, que tenta enxergar o lado de todos. Embora seja o menos brilhoso dos atores com funções protagonistas, Sutherland não se equivoca ao conceber Calvin. Mary Tyler Moore também tem uma realização interessante e até mesmo foi indicada pela Academia ao prêmio de Melhor Atriz, mas acho que uma análise mais atenciosa nos mostra que sua personagem é grandiosa, muito mais do que a atuação interpretação. Realmente acho que o modo como somos atraídos para a sua atuação se deve à intensidade – mal aproveitada, devo dizer – de sua personagem, Beth. Não lhe tiro o crédito, porém, pela sua indicação. Como disse, sua interpretação é correta e convence o espectador, tal como os outros personagens. Judd Hirsch, intérprete de Dr. Berger, o psiquiatra que cuida de Conrad, aparece em pouco tempo e realiza um bom desempenho, mas ele definitivamente some ao lado de qualquer ator do elenco. Nas cenas em que ele está com Timothy Hutton, é impossível notá-lo, nem o observava direito – meus olhos focaram-se no magnetismo de Hutton, que me surpreendeu. A indicação que Hirsch recebeu foi pra preencher a lista dos cinco indicados, só pode.

Dramas familiares como esse me soam interessante porque narram eventos cotidianos, que podem acontecer conosco. Vale comentar sobre o título original e também a escolha nacional – ambos remetem aos personagens centrais: eles são pessoas comuns, como nós. Não acho, porém, que Ordinary People seja o melhor do gênero. Decerto é uma boa obra, mas não alcança o conceito de “bom”. É uma obra satisfatória, que me envolveu, mas não me emocionou totalmente. Mas vale a pena conferir, pelas boas interpretações e pela eficiente direção de Redford.