The French
Lieutenant’s Woman. Reino Unido, 1981, 124 minutos, drama. Diretor: Karel
Reisz.
Potencialmente, uma
das interpretações mais pungentes de Meryl Streep num enredo que cativa o
espectador.
O filme dentro do filme. Não se trata de uma
característica em comum nos roteiros cinematográficos, afinal a linguagem
falando dela mesma – no caso, o cinema falando dele mesmo – é um recurso
metalingüístico já bastante explorado e sempre revolve a curiosidade do
espectador em relação a determinados assuntos. Nesse filme, de 1981 estrelado
por Meryl Streep e Jeremy Irons, vemos o uso desse recurso: na trama, o livro
“A Mulher do Tenente Francês” (1969), de John Fowles, é adaptado no filme de
mesmo nome no qual os atores Anna e Mike interpretam os protagonistas do
romance literário Sara e Charles, respectivamente, uma moça marginalizada na
sociedade inglesa na qual vive e um biólogo que eventualmente se apaixona por
ela.
Têm-se dois plots
nesse filme, ou, como vejo, uma trama central (o romance entre Sara e Charles)
e uma história secundária, que mostra os atores Anna e Mike desenvolvendo as
personagens do livro, mas, apesar de a diferença na narrativa ser nítida, o
ápice do filme é justamente conseguir mesclá-las num único enredo, no qual os
personagens de Anna e Mike, os atores, se confundem com os personagens Sara e
Charles, do filme que estão fazendo. Percebemo-los em épocas notadamente
distintas – os atores que gravam o filme vivem a contemporaneidade enquanto os
personagens interpretados por eles encontram-se no século XIX, época na qual as
convenções morais eram bastantes ferrenhas e, sendo assim, eram as principais
causas dos problemas de Sara. Antes de dar continuidade, penso que seja
importante ressaltar a importância dos trabalhos de Meryl Streep e Jeremy Irons
nesse filme, porque eles conseguem com eficiência apresentar distinções entre as
duas personagens que interpretam e conseguem ministrar bem as doses de drama e
de humor a cada seqüência filmada, garantindo assim que não nos confundamos em
relação a quem estamos vendo, mesmo que, como no caso de Mike / Charles, haja
uma notável comunhão entre os personagens nos momentos finais da história.
A mulher do tenente francês é uma mulher cuja vida parece
bifurcada entre esperar e sofrer. Sua espera, como todos dizem, é por um homem
que a tornou o que ela é, e seu sofrimento, segundo ela mesma, é por se ter
casado com a vergonha ante os acontecimentos que lhe surgiram na vida,
fazendo-a ser o que ela é e fazendo-a ser aquilo que os outros pensam que ela
seja. Charles, em frente à figura misteriosa de Sara, não consegue manter-se
firme na sua proposta de somente ajudá-la e pouco a pouco cede às pressão
internas, enamorando-se gradualmente dela, aproximando-se de tal modo que se
veria irrefreável mais tarde, principalmente porque toda a sua vida seria
transformada por causa do seu amor com uma mulher julgada mundana e, sobretudo,
pelo cancelamento do seu casamento com Ernestina, nobre da região cuja família
e extremamente influente.
Penso que a qualidade do filme se deve mais à atuação dos
atores principais do que ao seu roteiro, direção ou mesmo sua fotografia, que é
muito interessante, intercalando bons momentos sombrio à história que é
narrada. Meryl Streep com certeza concebe uma interpretação que mistura
angústia e alívio, em momentos marcados e eficientes, em situações fundamentais
a continuidade da trama. A atriz consegue realmente mostrar eficácia e paixão à
sua interpretação, basta vê-la como Sara, toda resignada e passional em
situações que realmente a estrangulam o tempo todo e não lhe permitem sair da
clausura moral na qual vive. Jeremy Irons também oferece uma interpretação
bastante sólida, principalmente como Charles, e faz o espectador compreender
perfeitamente a relação entre ele e Sara e o porquê de ele tão suavemente ceder
aos encantos daquela mulher misteriosa.
Não nego que meu principal atrativo pelo filme era
conhecer, a princípio, que conexões e faria entre as duas histórias mostradas e
de que forma as personagens do filme estrelados por Anna e Mike interfeririam
na vida dos atores. E é notável que parecem as histórias caminharem em sentidos
opostos: se a situação de Sara e Charles fica cada vez mais difícil, a situação
de Anna e Mika parece bastante fácil, apesar de ambos serem casados e, qual os
personagens no filme que rodam, não devessem por motivos morais estabelecer tão
comunhão.
A obra não é confusa, apesar das duas
narrativas, na abstração, se embaralharem. Digo “abstração”, porque é evidente
na trama que cada uma é muito distinta da outra, Karel Reisz fez questão de não
torná-las uma só justamente para que não se perdesse a estética de cada
subtrama. Mas é evidente que há um momento no qual as duas narrativas se unem,
associando-se – a última cena do filme nos prova isso. O diretor conseguiu
arrancar de seus atores excelentes interpretações e, mais do que isso,
conseguiu unir excelentes características ao filme – sua fotografia e direção
de arte são elogiáveis, basta ver as cenas que irremediavelmente nos remetem às
poesias bucólicas, com a melancolia crescente num misto de confidência e
apreciação em meio ao verde brando do bosque; também as cenas em que Sara fica
no caminho de pedras que leva ao mar, observando o mar, supostamente esperando
o amado regressar, apesar de saber impossível o seu retorno. Reisz realmente
nos trouxe uma obra pungente, que, embora com alguns problemas na execução da
parte final, consegue manter o espectador atento à trama, ansioso pelo que virá
depois, sem desgrudar os olhos, sobretudo, da excelência cênica de Meryl
Streep, irrepreensível. Se a trama não chamar a atenção, vale pelo menos para
conferir o desempenho do casal Streep-Irons, que realmente são a alma dessa
produção.
3 opiniões:
Ainda não assisti a este filme, mas todos dizem se tratar de uma das obras mais densas que a Meryl Streep já fez. A conferir ainda! Adorei seu texto!
Esse especial da Streep está realmente sensaional!! Também ainda não vi este filme, mas se Meryl tem uma boa atuação, então vale a pena!
Verei!
Pouca gente viu... O que é uma pena. Fica no meu TOP 10 de interpretações da Meryl!
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