The Short Second Life
of Bree Tanner: An Eclipse Novella. EUA, 2010, 190 páginas –
Editora Intrínseca. Autora: Stephenie Meyer.
A mesma história de Crepúsculo com personagens de nomes diferentes.
A menina estava
enroscada como uma bola ao lado das chamas, os braços envolvendo as pernas. Era
muito nova. Mais nova do que eu – parecia ter talvez 15 anos, o cabelo escuro e
liso. Os olhos estavam focalizados em mim e as íris eram de um vermelho vivo e
chocante. Muito mais brilhantes do que as de Riley, quase em fogo. Giravam
loucamente, descontroladas. [...]
- Ela se rendeu
– disse-me em voz baixa.
(MEYER, 2009,
p. 404).
“Crepúsculo” (2005) é um romance
lançado há sete anos e que definitivamente foi o grande momento pós-Harry
Potter. Não que a escrita de Stephenie Meyer tanja a qualidade daquilo que J.
K. Rowling produziu ao longo de 10 anos (1997-2007) – na verdade, está muito aquém da série
de fantasia bastante madura escrita pela britânica. No entanto, de modo algum
se pode negar que as personagens compostas por Meyer se popularizam de tal
maneira que é impossível hoje em dia não saber quem são Isabella Swan ou Edward
Cullen. Não que isso, claro!, significa apreciar ou depreciar a obra, mas a
modernização do vampiro – objeto de paixão de alguns – provocou debates de
proporções imensas, das quais não pudemos, querendo ou não, deixar de ouvir.
Mas o ponto dessa resenha é
outro. É justamente a obra lançada em 2010, depois dos livros “Lua Nova”
(2006), “Eclipse” (2007) e “Amanhecer” (2008), que aparentemente finalizaram a
trajetória da protagonista humana, que permanece nessa natureza até meados do
último romance, quando finalmente se torna vampira. “A Breve Segunda Vida de
Bree Tanner”, como o próprio subtítulo sugere, se trata de um spin-off do terceiro livro, cujo grande
momento é o embate provocado por Victoria, cujo namorado foi assassinado por
Edward no primeiro volume, de quem ela gostaria de se vingar – na narrativa, a vampira cria
vampiros recém-criados e, por isso, bastante fortes e descontrolados,
induzindo-os através de Riley a atacar a família Cullen. Bree Tanner, que era
uma moradora de rua esfomeada quando foi transformada em vampira, narra os
acontecimentos anteriores aos eventos de Eclipse
a partir do momento em que sai para sua primeira caçada com Diego, outro vampiro jovem que também passa a
desconfiar das intenções de Riley e da mulher – Victoria –, ao criar aquele
pequeno exército.
O trecho que citei logo na
abertura desse texto aponta o momento no livro “Eclipse” no qual Bree é
apresentada pela primeira vez, ainda sem nome, que só nos seria revelado duas
páginas depois, quando Jane – uma dos Volturi – a indaga acerca de suas origens
e, também, da sua identidade. O que há de surpreendente no livro em relação ao
comportamento de Bree é que, como comentado por Edward e notado pelos outros
Cullen, aquilo não era comum – que um vampiro recém-criado se rendesse e, como
vêem, se esforçasse para se controlar. Não é spoiler dizer que Jane Volturi não perdoa Bree e a extermina, como,
afinal, ditam as regras – o extermínio de Bree já havia sido lido três anos
antes nas páginas do terceiro episódio da saga. O que interessa nesse novo
romance são os momentos anteriores ao combate entre o grupo de Victoria e a
família Cullen – também, não menos importante, surge aqui um romance entre Bree
e Diego, dois personagens que dividem um momento significativo e, a partir
disso, criam uma afinidade que eventualmente se aproxima de amor.
A parte boa desse romance é que,
em apenas 190 páginas, menos que a metade da quantidade de páginas do livro do
qual deriva, a escritora conseguiu escrever tudo aquilo que era relevante para
a história. Aliás, pode-se facilmente reduzir o número de páginas se fossem
extraídas as tantas vezes que Bree Tanner, a narradora, se pergunta acerca de
perguntas já feitas três ou quatro vezes anteriormente. O mais curioso é que
não é apenas um efeito retórico no discurso – a personagem não repete sua
pergunta para que o leitor compreenda o grau de preocupação que a perturba.
Trata-se apenas de uma escrita prolixa que tenta a todo o momento justificar a
densidade psicológica de uma personagem cujo intelecto definitivamente não está
em paridade com suas atitudes.
Bree Tanner é uma personagem
bastante simplista. Apesar de nos serem dadas algumas informações sobre ela –
havia fugido da casa do pai, estando morando nas ruas, quando trocou sua vida
por um hambúrguer –, temos uma constante sensação de que não sabemos nada sobre
ela. Na verdade, apesar de estarmos ante a história de Bree, sendo, aliás, contada
por ela mesma, acabamos pensando o tempo que toda a história é sobre ela, Bella. Lembrando, em tempo, que
devemos sempre distinguir escritor/autor de narrador: se Meyer detém os
direitos autorais, sendo, pois, a autora, é Bella, Jacob (no epílogo do terceiro
livro e numa das partes do quarto) e Bree Tanner que são os narradores,
havendo, portanto, necessidade de distingui-los em suas maneiras de narrar o
que vêem – são, afinal, três personagens distintos! E, honestamente, não fosse
por um ou outro momento, fica sempre a sensação de que “A Breve Segunda Vida de
Bree Tanner”, e vez de um spin-off
narrado por Bree Tanner, se trata de mais um episódio da saga Crepúsculo,
narrado por Bella, como em todos os outros livros. Transcrevo abaixo o único
momento que mais se faz notar que a personagem é uma, não a outra:
Era isso que
Riley nos mandava fazer. Caçar a escória. Escolher os humanos de quem ninguém
sentiria falta, aqueles que não estavam voltando para casa e para a família, os
que não gerariam ocorrências de desaparecimento. [...] Desliguei meu cérebro.
Era hora de caçar. [...] Sua [de Diego]
aterrissagem foi silenciosa demais para chamar a atenção da prostituta chorona,
da prostituta distraída ou do cafetão zangado. Saltei do telhado, atravessei a
rua e aterrissei ao lado da loura que chorava. [...] Ela abriu a boca para
gritar, as meus dentes dilaceraram sua traquéia antes que algum som pudesse ser
emitido. [...] O sangue era mordo e doce.
(idem, 2010, p.
18-20)
O trecho acima apresenta o
momento divisor de águas, que é justamente aquele que transforma Bree, a outsider, em alguém com um companheiro
com quem dividir alegrias e tristezas. É extremamente superficial o contato dos
dois – apenas uma caçada –, mas isso parece suficiente para começar uma boa amizade,
até amor, por que não? Naquela mesma noite, os dois passam a partilhar juras e
prometem dar suporte sempre um ao outro. Houvesse um princípio de rejeição por
qualquer um deles em relação ao outro, independentemente das razões, decerto o
romance estabelecido seria idêntico ao de Bella e Edward. Aliás, cabe dizer o
quanto as duas personagens – Bella e Bree – são bastante parecidas, a começar
pelo modo como sempre parecem desajustadas e intrusas às circunstâncias. Seguem
passagens, uma de “Crepúsculo”, outra do objeto resenhado.
Não era só
fisicamente que eu não me adaptava. [...] Eu não me relaciono bem com as
pessoas da minha idade. Talvez a verdade seja que eu não me relaciono bem com
as pessoas, e ponto final. [...] Às
vezes eu me perguntava se via as mesmas coisas que o resto do mundo.
(idem, 2008, p.
18)
Eu franzi a
teste. A casa de Riley era o último lugar onde eu gostaria de passar o resto da
noite. Não queria ver o rosto estúpido de Raoul nem ouvir os gritos e as brigas
constantes. Não queria ter de ranger os dentes e me esconder atrás do Freaky
Fred para as pessoas me deixarem em paz.
(idem, 2010, p.
28)
Acima, um exemplo do desajuste
social e pessoal que as personagens vivem. Além disso, Bella com Edward e Bree
com Diego, ambas vivem romances marginalizados – no caso de Bree, mesmo que
tanto ela quanto seu par sejam da mesma natureza, é evidente que todos os
personagens que o circunvizinham desprezariam o relacionamento, o que os obriga
a manter a guarda perto dos outros, seja por autopreservação ou por preocupação
com o outro. Ambas as protagonistas lutam contra um inimigo invisível – Bella
nunca sabe o quanto de risco há para ela por conviver com vampiros e Bree,
grosso modo, também, salvo o fato de que ela sabe que o inimigo verdadeiro (não a grupo de
recém-criados, sempre em desavenças) se mantém escondido o tempo todo e parece
planejar algo perigoso.
Poderia resultar em algo
verdadeiro interessante apresentar o ponto de vista de uma história pelas
perspectivas de outras personagens. O “Efeito Rashomon” poderia ser
magnificamente explorado nessa obra se, além de uma boa composição literária
que não se alicerçasse em senso comum, Stephenie Meyer houvesse realmente se
preocupado em criar personagens diferentes em situações que demandassem um desenvolvimento
psicológico aprofundado delas. O que se vê, no entanto, é apenas toda a
história da saga Crepúsculo confinada em 190 páginas, das quais 1/5 – as
últimas 40 páginas, praticamente – é se trata na verdade de uma releitura do
episódio registrado anteriormente em “Eclipse”. Pode-se ler o livro
tranquilamente em uma tarde e gastar cinco ou seis horas seguidas atento às
páginas, sobretudo porque não há nenhuma dificuldade na digestão desse romance,
que é tão superficial quanto nenhum outro título da série ainda havia
conseguido ser. Talvez seu maior mérito seja “externo” à qualidade literária da
obra – paguei apenas R$5 nesse título que, de brincadeira, daria de presente a
um colega. No mais, carece de estrutura adequada para que se faça notar como uma
boa leitura.
Referências:
MEYER, S. Crepúsculo. Tradução
de Rita Vinagre. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2008.
______. Eclipse. Tradução
de Rita Vinagre. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2009.
______. A breve segunda vida
de Bree Tanner: uma história de Eclipse. Tradução de Déboro Isidoro. Rio de
Janeiro: Intrínseca, 2010.
1 opiniões:
Li todos os livros da série "Crepúsculo", mas, pra mim, basta. Não fiquei curiosa para ler esse outro livro da Stephenie Meyer, muito menos aquele "A Hospedeira".
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