27 de jul. de 2012

Rocco e Seus Irmãos


Rocco e i suoi Fratelli. Itália / França, 1960, 168 minutos, drama. Diretor: Luchino Visconti.
Uma obra que prima pela verossimilhança, sobretudo com sua direção bastante realista.

Esse é o meu primeiro filme de Luchino Visconti a que eu assisto e confesso que, embora o filme em si não tenha e contagiado, fiquei bastante satisfeito com a direção sólida que se apresenta por todo o filme. A história da família Parondi  - Rosaria, a mãe, Simone, Rocco, Luca, Vincenzo e Ciro –, da sua migração aos conflitos pessoais, nos é contada ao longo de quase três horas de filme, nas quais vemos os irmãos Rocco e Simone se enamorando da mesma mulher, Nadia, ao mesmo tempo em que a família tenta manter-se num lugar fixo e tenta conseguir dinheiro para se sustentar.

Não se pode ignorar a estética fílmica a que essa obra pertence. Estando localizada no Neorealismo Italiano, movimento que se focava, sobretudo, nos dramas da classe trabalhadora e nas suas dificuldades de convívio com a sociedade, principalmente por causa das questões financeiras a que a Itália havia sido submetida após a Segunda Guerra Mundial, compreendemos a importância do trabalho para a família Parondi, que se vê não apenas sem condições de arcar com o valor da atual moradia, como já pensando no que farão quando forem despejados, passando, então, a viver às custas do governo. Ainda que inserida no neorealismo, não é o contexto social o verdadeiro foco do filme, uma vez que o que se tem aqui é apenas uma rápida visualização da situação do momento social, de grande perturbação para a Itália pós-guerra.

 Nadia e Rocco, personagens que se envolvem depois do relacionamento dela com Simone, irmão de Rocco.

O foco do filme reside no triângulo formado por Simone, Nadia e Rocco. A prostituta é primeiro vista quando seu pai, furioso, quer lhe aplicar uma surra, da qual ela foge desesperada, encontrando eventualmente Simone, um rapaz de baixa auto-estima, com quem ela acaba enamorada. Mas ela adverte – estão juntos, mas não se trata mesmo de um namoro. A moça é livre, prima por isso, prima por viver como quer, inclusive chocando a família logo na sua primeira aparição na casa: passeia livre pelo cômodo em roupas sedutoras, conversa com cada jovem ali, pouco a pouco os cativando, somente para depois fugir assim que Simone pede a um oficial que acompanhe a moça, já que seu pai lhe havia querer de agredir de novo. E Nadia é um intermédio das figuras de Simone e Rocco, o rapaz seguro, que, embora quieto – o protagonista, para se ter uma idéia, só surge enfaticamente a partir dos 30 minutos –, é bastante convicto em suas ações. O bambear que se vê em Simone não se verifica em Rocco, de postura quase altiva – só não o é, porque sua essência é humilde.

Embora extremamente realista, pelo menos na direção de Visconti, que prima pela dinâmica e pelo retrato bastante cru dos personagens, há um quê de fabular nas personagens. Podemos ver a dualidade presente na narrativa: o bem vs. o mal nas figuras de Rocco e Simone, respectivamente. E tudo que os cerca – salvo Nadia, figura dúbia, que, como disse, está entre os dois – parecem se apresentar numa dialética de oposição: o declínio de Simone no boxe paralelo à ascensão de Rocco; o gradual desapego de Simone à família em paralelo à constante tentativa de Rocco para manter a família unida; o ter de Simone (em relação à Nadia) e o querer de Rocco, situação que depois será revertida. É como se, de modo paulatino e intenso, fôssemos nos apegando a um ideário fantasioso de bem e mal, nas abstrações da crença, não na concretude do que é palpável – em alguns momentos, Rocco e Simone são idéias, não mais pessoas. Nessas constantes dicotomias, Nadia se encontra a perturbar e a expurgar os sentimentos dos personagens, o que culmina num final bastante doloroso e incômodo, numa cena de violência que, embora voltada contra Nádia, afeta os três personagens e o modo como eles se enxergam.

Potencialmente, a obra perderia sua força se seus atores não estivessem tão bem envolvidos com seus personagens. Essa produção franco-italiana encontra poder na crueza com que as criaturas – chegam a um ponto de serem criaturas mesmo – são enquadradas e apresentadas a nós, desde a dificuldade financeira e o já primeiro contratempo com a família da namorada de Vincenzo, um dos filhos, até o final desgostoso, que implica toda a brutalidade que se vinha acumulando ao longo das quase três horas de filme. A meu ver, um título interessante de ser conferido, mas, também, bastante difícil de ser digerido, sobretudo pelo modo lento da narrativa, que disseca os personagens até um ponto que parece não haver mais o que extrair deles – e depois recomeça o processo de caracterizá-los, atribuindo-lhes mais fulgor. A dificuldade da obra consiste em sua densidade, também conquistado pela atmosfera constante de perturbação ao longo da trama – a crise na família Parondi, que antes se resumia à questão financeira, agora se resume aos sentimentos entre os irmãos. Vale a pena assistir a esse filme, conhecer Rocco e seus irmãos e ver como pessoas que sempre conviveram podem rapidamente se desgraçar.

4 opiniões:

Kamila disse...

Mais um filme que eu ainda não assisti. Mais um grande texto seu!

J. BRUNO disse...

este é outro que está na minha lista dos 'próximos a serem assistidos' já faz alguns meses, outra vítima de minha falta de tempo...

Assim que eu conseguir driblar a falta de tempo eu vou escrever sobre ele!

http://sublimeirrealidade.blogspot.com.br/2012/07/o-pequeno-principe.html

Unknown disse...

Ótimo texto, amigo. Eu gosto muito do filme, mas concordo que não seja uma obra das mais fáceis.

ANTONIO NAHUD disse...

É o melhor filme que já vi...

O Falcão Maltês