29 de jan. de 2011

A Linguagem Secreta do Cinema

The Secret Language of Film. EUA, 1994, 197 páginas (Editora Nova Fronteira - 1ª edição especial, de 2006). Autor: Jean-Claude Carrière.
Esse é definitivamente um livro que todo cinéfilo deveria ler.

Esse livro se trata de uma das preciosidades que esporadicamente encontramos nas nossas buscas literárias. Como o meu projeto da faculdade envolve literatura e cinema, acabei diante desse título notável, escrito pelo roteirista francês Jean-Claude Carrière, famoso pelas suas muitas obras, como, por exemplo, Belle de Jour, dirigida pelo espanhol Luis Buñuel. Carrière pouco a pouco introduz o espectador ao mundo do cinema. Ou, pelo menos, a uma parte desse grandioso mundo. O autor vai nos contando a respeito de suas experiências com o cinema e aquilo que aprendeu com as gravações das quais participou. Seu enfoque não é exclusivamente no modo como a linguagem cinematográfica é concebida – o autor propõe também uma análise do ponto de vista do espectador, tornando então o livro muito mais interessante, pois ele dá uma amostra do pensamento do diretor e também do espectador, compreendendo ambos os lados que se comunicam.

É claro que o mais divertido são as curiosidades que ele conta a nós. Por exemplo, ele nos revela alguns acontecimentos por trás dos sets de filmagem, aborda um pouco das características mentais de quem recebe uma mensagem emitida por uma cena. Quanto ao primeiro aspecto, ele cita um acontecimento engraçado a respeito do filme Belle de Jour: numa das cenas, um homem mostra algo numa caixinha e uma prostituta é bastante convicta ao negar-lhe; então, o homem mostra a Séverine, personagem de Catherine Deneuve, e ela aceita prontamente. Na verdade, ninguém sabia ao certo o que havia na caixinha – nem mesmo o diretor e o roteirista. A cena servia para aprofundar a lascívia de Séverine. Um dia, então, o roteirista teve contato com um laosiano e segue a passagem: "[...] o homem contou-me que, outrora, algumas requintadas senhoras laosianas costumavam atar um grande besouro com uma fina corrente de ouro e colocá-lo no clitóris, durante o ato sexual. A agitação das muitas pernas da criatura produzia um grau indescritível de prazer adicional” (p. 86).

Com todos os seus anos de experiências, o roteirista ainda explica como alguns filmes causam estranhamento no espectador, por uma série de motivos – às vezes, a passagem do tempo parece disforme (por exemplo, há uma cena durante o dia, intercalando duas cenas extensas durante a noite; se a cena durante o dia for curta demais, o efeito obtido é incômodo), às vezes é o posicionamento da câmera e as direções descritas (se um personagem diz que vai pro leste e anda para a esquerda, lado que o espectador assume ser oeste). Comenta também sobre alguns pequenos detalhes que cabem à equipe técnica de um filme. Numa das passagens, Carrière comenta que a equipe de direção de arte estava riscando as paredes e o roteirista perguntou o porquê; a ele foi explicado que os personagens que viviam naquele ambiente eram muito pobres e nem sempre podiam pagar o aluguel, aí quando pressentiam que seriam despejados ou quando recebiam o aviso do despejo, eles tentavam fugir com alguns de seus móveis, que arranhavam as paredes. O roteirista comenta que, sem aqueles detalhes, muito do efeito estético teria sido perdido naquela cena.

Inquestionavelmente, trata-se de uma obra que todos os cinéfilos deveriam ler, porque a sua abordagem é realmente muito interessante. Não apenas pelas curiosidades, mas também pelo muito que Carrière tem a contar sobre a sua vida pessoal e sobre os seus envolvimentos profissionais com grandes nomes do cinema, como Luis Buñuel, Hitchcock, etc. Decerto, um livro que merece estar nas nossas estantes.

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