30 de nov. de 2011

Burlesque

Burlesque. EUA, 2011, 199 minutos, musical. Diretor: Steve Antin.
Diferentemente da maioria dos musicais que vejo, Burlesque parece desprovido de muitos aspectos que tornam um filme musical memorável. Nem sequer as canções compensam a ausência de roteiro.

Já disse inúmeras vezes e torno a repetir a cada nova vez que eu for escrever sobre um filme musical: eu gosto desse gênero. Gosto mesmo, gosto com sinceridade – posso passar a tarde toda assistindo à história de pessoas que, em vez de falar, cantam! No entanto, acho importante que um filme composto na estrutura de uma obra musical não use isso como desculpa para não apresentar um bom roteiro. Para mim, Chicago, Moulin Rouge, Rent, por exemplo, são filmes musicais em que, somado às boas músicas, há um roteiro interessante, que vale a pena ser analisado cuidadosamente.

Burlesque é um filme recente, que é encabeçado por duas estrelas primeiramente cantoras, o que deveria favorecer imensamente as cenas que primam pela qualidade vocálica. Não se pode comparar o talento vocal de Cher ao talento vocal de Nicole Kidman, porque nos seria evidente que a comparação seria um pouco injusta, principalmente quando pesarmos que, embora ambas trabalhem com a voz, Cher já está muito mais apta aos grandes esforços que cantar requer. Acrescentamos a esse fato – de que as lead actresses são cantoras profissionais – a informação de que Cher já conquistou um Oscar, o que nos faz supor que sua capacidade de atuação seja – ou tenha sido, um dia – boa. Aí, faço então a pergunta maior: como pode um filme com potencial para ser tão bom se tornar tão cansativo? A resposta é simples: o roteiro é mal estruturado e a história é mal conduzida.

Praticamente esses são os piores defeitos de Burlesque. Ouso dizer que a história de Alice, uma garota caipira que vai tentar a vida em outro lugar – no caso, a casa de shows que dá título ao filme –, poderia ser interessante, ainda que esse mote já esteja muito gasto. Deparamo-nos com uma história básica bastante clichê que não é explorada de um modo interessante, restando ao espectador pedaços de vários outros filmes e toda uma sensação de que tudo em cena já foi visto antes. Não sei o quanto eu devo comentar sobre Cher e Christina Aguilera, porque não sei exatamente se era esperado que elas atuassem: é visível ao longo do filme que a intenção principal do diretor era nos presentear com canções e números musicais de estética visual muito positiva e não exatamente com aquilo que as atrizes tinham para oferecer. Muitos alegarão que esse é, afinal, um filme musical, não um drama – aí se contrapõe o argumento, bastante sólido, de que todo filme deve apresentar os requisitos básicos para que seja considerado uma boa obra – direção eficiente, abordagem inovadora por parte do roteiro, atores empenhados, edição de cenas eficaz etc. Independentemente do gênero da produção cinematográfica, é necessário que certas regras sejam obedecidas.

Ainda que atuação não seja o aspecto mais marcante do filme – aliás, nem chega perto de sê-lo –, o filme aposta na estética visual e busca capturar a atenção do espectador com muitas coreografias. Isso não se mostra positivo, porque há números musicais em excesso para completar a ausência de história e para disfarçar o modo como os personagens são chatos e superficiais. Mal uma cena de música termina, já começa outra de dança; ao final dessa, surge uma nova cena. Isso parece tão interminável que o filme de duas horas parece ter cerca de quatro horas. Nem mesmo quando eu assisti ao filme Cleopatra, de 192 minutos, eu fiquei tão cansado quanto fiquei ao conferir Burlesque, que possui mais de uma hora a menos. Aliás, é também impressionante o modo como conseguiram estender um filme que, ao meu ver, não precisaria de mais do que 90 minutos para começar, se desenvolver e ser concluído – penso até que um bom diretor teria nos apresentado essa história em 70 minutos, nos poupando de toda a preguiça que surge conforme o filme se desenvolve (ainda que não haja qualquer desenvolvimento). Tudo em Burlesque é tão plano que cansa: os personagens são sempre os mesmos, as cenas são sempre as mesmas. Não é que seja impossível assisti-lo, afirmo com segurança que é fácil vê-lo; é preciso, no entanto, muito bom humor e paciência, ou, talvez, seja necessário ser fã de uma das atrizes-cantoras ou talvez das duas.

Assistir a Burlesque é, de certa forma, meio embaraçoso, pois percebemos que esse é um filme que não cumpre com nenhuma de suas propostas. Não entretém tanto quanto pretendia entreter, não anima com os seus números, não faz rir, não é dramático. É tão mediano que dois dias depois de vê-lo eu já tinha me esquecido de tudo, inclusive do nome da personagem principal, que eu nem lembrava mais se era interpretada por Christina Aguilera ou por Cher - aliás, querida, você já esteja bem melhor lá na década de 80, hein, principalmente em Moonstruck! Acredito que haja inúmeros outros filmes bem mais interessantes, com realizações mais cuidadosas e que merecem muito mais a nossa análise. Burlesque é um título que provavelmente será esquecido, até mesmo pelas pessoas envolvidas nessa produção.

28 de nov. de 2011

Amor e Outras Drogas

Love and Other Drugs. EUA, 2011, 112 minutos, comédia. Diretor: Edward Zwick.
Definitivamente se trata de um filme que poderia render bem mais devido a alguns temas e aos atores principais, mas que se mostra apenas mediano.

Confesso que eu simpatizo com os trabalhos dos atores Anne Hathaway e Jake Gyllenhaal e foi basicamente essa simpatia que me motivou a assistir a esse filme. Ainda que tenha assistido a bons filmes nos quais eles mostram atuações densas – Rachel Getting Married e Brokeback Mountain, por exemplo –, não foi pelo conteúdo do trabalho dos atores que eu decidi dedicar quase duas horas a essa obra.

Tendo lido a sinopse do filme e sabendo mais ou menos o que a obra abordava, eu pensei no quanto seriam bem trabalhados os temas delicados, como a relação do paciente com a sua própria doença e, principalmente, a relação do enfermo com a sociedade. Mesmo não sendo uma obra especificamente dramática, Love and Other Drugs apresenta uma vertente condicionada irremediavelmente ao drama: Maggie possui Doença de Parkinson aos 26 anos. Basta essa informação para que se depreenda muito a respeito do filme. Por mais que a narrativa esteja voltada para a expressão cômica, basta a semântica da doença de Maggie para acrescentar o tom dramático que se verificará em alguns momentos – sua doença é degenerativa e ela, bastante jovem, é uma exceção, pois a doença normalmente se manifesta em pessoas mais velhas. Jamie Randall é um representante farmacêutico que a conhece casualmente, quando ele oferecia seus produtos a um hospital. Como ele é mulherengo e ela busca aproveitar o máximo possível, eles rapidamente se envolvem, para o que supunham ser apenas sexo casual e que, mais tarde, se mostrará muito mais denso emocionalmente do que isso.

Não nego que essa não é uma obra cuja função é documentar os problemas do “mal” de Parkinson tampouco é focalizar-se nesse aspecto dramático. Apenas acho que um tema tão delicado foi submetido a um tratamento estranho, ficando em plano inferior a assuntos desmedidamente repetitivos, como as cenas de sexo. Não afirmo com resquícios de moralismo que as cenas são ousadas demais – reclamo mesmo é do excesso sem função: muitas cenas se repetindo sem que isso acrescente algo ao filme. Os personagens centrais – Maggie e Jamie – conquistam de certo modo a simpatia do espectador, mas é difícil gostar do filme como um todo por causa dos muitos personagens e situações aos quais nós ficamos simplesmente indiferentes ou que nos irritam. O médico e o ex-amante de Maggie são personagens nulos enquanto o irmão de Jamie é um verdadeiro incômodo. A relação de Maggie consigo mesma nunca é bem trabalhada e é difícil analisar mais de sua densidade psicológica, porque tudo que vemos são tremores e acessos de raiva – a personagem é composta apenas disso? Foi a pergunta que me fiz quando o filme acabou. Outro problema é a construção da figura de Jamie, que, muitas vezes, nos soa infantil e patético demais – seu personagem só sabe pensar em mulheres? Logo, eu constatei que não, embora ainda repetisse essa pergunta algumas vezes.

Não creio que seja um filme de humor duvidoso, mas, honestamente, não me fez rir e nem sequer fez com que eu achasse graça de qualquer coisa ali mostrada. O longo desenvolvimento do filme atrapalha inclusive algumas cenas, que deveriam ser engraçadas. Nem sequer sei se podemos mesmo afirmar que essa e uma comédia romântica – ora falta veia cômica, ora falta veia romântica. Nada, no entanto, impossibilita o espectador de assistir ao filme até o final; não o recomendo, porém. Acredito que se compararmos esse filme com alguns outros, poderemos notar uma qualidade superior em outros títulos do mesmo gênero. De um modo geral, acredito que esse – assim como The Tourist – filme só serve mesmo para mostra que os jurados do Golden Globe não compreendem o que é bom humor e o que é comédia – além de mostrar que filmes desse gênero estão em falta no mercado cinematográfico.

26 de nov. de 2011

Eu e o Cara da Piscina


Brasil, 2011, 8 minutos, curta-metragem drama. Diretor: William Mayer.
Um curta-metragem absurdamente eficiente ao mostrar as vontades por baixo das aparências e tudo aquilo que, embora não dito explicitamente, existe de modo indubitável.

A primeira coisa que me chamou a atenção nesse curta-metragem foi o modo como as cores parecem ressaltar todas as informações que pretendem ser passadas ao longo dos oito minutos. Sinto que antes mesmo de falar da sinopse, devo comentar a importância das cores, e só então comentar que a história percorre o momento de encontro de dois rapazes que estão num clube aparentemente vazio e que acabam se envolvendo.

Poucas vezes dois elementos – a história e algum recurso fílmico – conseguem confluir de tal modo que é impossível desassociar um do outro. E é justamente isso que acontece nesse filme dirigido por William Mayer, no qual as cores são fundamentais para a intensificação da sensação que se busca fazer o espectador sentir. Outro elemento fundamental é o calor – embora não o sintamos efetivamente, podemos senti-lo sinestesicamente – justamente por causa do uso das cores quentes que têm destaque na trama. Impossível não assistir a esse curta e não querer estar junto com os personagens. E essa aproximação causada serve ainda mais como elemento intensificador, porque, pelo prazer do ambiente, parece querermos buscar também o prazer da companhia e assim nos irresistivelmente chegamos perto desses personagens, que partilham de um momento aparentemente único, devido à diversão que parecem ter.

 A confluência das cores com a simbologia representada no enredo.

Em contrapartida, penso que a edição falha ao tentar criar a dinâmica do filme. O ritmo aconteceria gradualmente somente pelos elementos presentes: trilha sonora, cores quentes (que estão inevitavelmente associadas à velocidade), o próprio ambiente, por se tratar de um clube e, teoricamente, em nenhum clube reside a monotonia. Por algum motivo que eu desconheço, optou-se por cenas rápidas, de cortes velozes demais, quase bruscos às vezes, e isso faz com que o espectador, que pouco a pouco se envolvia na história dos personagens, acabe tendo a atenção dispersada para outro elemento, que nem acaba se mostrando um recurso artístico muito positivo. Também, talvez, a busca pela sensualidade tenha sido meio exagerada: chegaríamos ao momento no qual o sensual – e, até então, já não lidávamos com o sensual (sentido)? – se sobreporia a qualquer outra coisa mostrada e, assim, caminharíamos personagens e espectadores num único sentido.

Quanto a essa questão da busca pela sensualidade, creio que ela causou algum problema aqui porque estamos lidando com uma câmera objetiva que mostra a subjetividade do pensamento de um personagem. A distinção entre objetivo e subjetivo não se fundem bem quanto o diretor parece querer nos obrigar a, assim como o personagem, sentir atração pelo outro personagem. Se estávamos quase chegando na interiorização de um personagem, logo isso se rompe com essas cenas. Mas, conforme a história se desenrola, isso acaba sendo retomado, sem maiores complicações. Ainda assim, o anticlímax criado é um pouco desfavorável.

De um modo geral, penso que esse curta-metragem seja realmente interessante, principalmente pelo efeito de mise em abyme que acontece no final e, mais ainda, pela abordagem do enredo, que mostra justamente tudo aquilo que um amigo sente em relação ao seu melhor amigo, mas que, por motivos muitos – que não cabiam ser explicados –, não podem ser ditos. E os atores têm participação importantíssima, pois eles realmente convencem ao propor que são amigos e, no plano da imaginação, podem também ser amantes. Vale a pena conferir.

24 de nov. de 2011

Um Filme Sérvio - Terror sem Limites

Srpski Film. Sérvia, 2011, 104 minutos, terror. Diretor: Srdjan Spasojevic.

Um filme que poderia juntar cenas chocantes e crítica ao sensacionalismo fílmico de exploitation, mas que acabou limitado a uma película monótona só com cenas pseudochocantes.

Existem filmes cuja fama precede o lançamento dele próprio. E é exatamente isso que acontece com essa produção sérvia lançada esse ano. Somente o seu trailer já fazia com que o espectador ficasse tenso com a brutalidade da qual estaria diante e, a somar, os diversos comentários acerca dos momentos de incesto, estupro, pedofilia e tortura, somente faziam com que esperássemos uma obra espetacular.

Quando digo espetacular, me refiro ao sentido literal da palavra: espetáculo. Evidentemente que nem a sua sinopse poderia salvar o filme da arte de impressionar a visão ao mesmo tempo em que trabalha a compreensão – desse modo, eu esperava que a história do ator pornô Milos – que se põe em extremo perigo ao aceitar um novo emprego – fosse primeiramente – primordialmente, talvez – de revirar o estômago e depois, dependendo do argumento do roteiro, uma obra crítica ou artística.

Mas devo tomar cuidado com os termos ao abordar esse filme. Só porque revira o estômago não é artístico? Vale lembrar que a arte é desautomatizadora, acima de qualquer outra característica sua. Pode-se abordar qualquer assunto: sexo, escatologia, miséria, deficiências físicas – ainda assim ser extremamente artístico, exatamente pela capacidade de conseguir expressar um ponto de vista além do senso comum. E é isso que falta a Srpski Film – falta essa vertente menos literal, mais abstrata: o filme é chocante num sentido limitado, pelo menos quanto às cenas que nos são mostradas.

Percebi uma dose bastante grande de realidade em algumas cenas – basta que observemos a cena final para concluir isso –, e é justamente isso que soa desagradável, já que o seu roteiro explicita a idéia de uma crítica ferrenha ao sensacionalismo do cinema. Pode-se perceber que toda a ousadia do enredo e das possibilidades de filmagem se perde em duas direções: aquela na qual, em oposição ao anticonvencionalismo apregoado, vemos cenas parcamente realizadas no que diz respeito à exposição (vê-se, por exemplo, um pênis aveludado, de pelúcia ou algo assim em vez de um real); e aquela na qual a crítica simplesmente some, dando lugar a desenvolvimento falho da trama.

Vamos à análise do primeiro elemento supracitado. Não se pode negar que a obra chama a atenção primeiramente por causa de sua proposta não-convencional de expor um enredo todo “distorcido” no que diz respeito ao senso-comum: fala-se no filme de um ator pornô que se envolve num trabalho obscuro, do qual nem ele sabe muito, a fim de conseguir tirar a família dos problemas financeiros pelos quais estão passando; nesse seu trabalho, um filme pornô – um filme dentro do filme, e aqui se vê a metalinguagem cinematográfica –, ele acaba confrontado com uma série de coisas pelas quais não esperava passar. Curioso notar que um filme com essa abordagem simplesmente caia em erros grotescos como o medo da exposição: se é mostrado estupro e tortura, por que não mostrar um pênis ereto? Por que uma cena de estupro a um recém-nascido se, ao focar o bebê explicitamente, percebemos com visibilidade bruta que se trata de um boneco? São dois exemplos de situações que prejudicam a credibilidade do filme enquanto obra artística desautomatizadora.

O segundo item, para mim, talvez o pior deles, porque a sua deficiência faz com que nossos olhos se voltem com mais atenção para o item citado no parágrafo anterior. O enredo parece se limitar apenas às cenas chocantes , já que ao longo de todo o filme percebemos que há só um derramamento das outras cenas, como o desconforto de Milos com o trabalho no qual se envolveu e também a sua busca frenética por respostas e por lembranças do que aconteceu depois que o drogam quando ele, impaciente e chocado, resolve abandonar as filmagens. Fora das cenas fortes do filme, todas as outras são lentas e monótonas, como se fosse exatamente para o espectador aguardar ansioso que virá a seguir, o próximo momento de violência. Seria um elemento interessantíssimo – e já explico o porquê – se soasse mais como intenção do que como falha da direção.

Pensemos nas características espetaculares do filme e na crítica que ele propõe ao mostrar a devastação promovida por uma espécie de modernismo cinematográfico, na qual, como o diretor do filme pornô diz, reside a “arte pela arte”, ou seja, arte ensimesmada, na qual todo elemento pode ser convertido em arte – até mesmo a vida (e isso já foi excelentemente explorado no filme The Truman Show). Se preocupados exclusivamente, sem atentar para como ela afeta a vida, não resta dúvida de que o perigo é eminente e pode-se entender que isso seja usado no filme, num uso interessante da metalinguagem: voltar a atenção do espectador para as cenas chocantes, mesmo quando há muito mais que se ver, é, afinal, um modo de mostrar o quão alienador é a exploração do grotesco sem preocupação crítica. Isso está presente no filme, inegável – mas repito: parece que é por falha na direção, que realmente intensifica as cenas sexuais e violentas com dinâmica enquanto cabe a quaisquer outras cenas um profundo desinteresse, mesmo por parte da câmera que as filma.

Trata-se de uma obra com algum valor, evidentemente, mas, ao meu ver, está meio longe de se firmar como bom cinema, no que diz respeito aos diversos elementos que estão presentes numa boa produção fílmica – não vi atuações satisfatórias, nem um roteiro que se desenvolve completamente, ou aquele sutil charme que é capaz de fazer com que o espectador se envolva. E nem fala de beleza, porque, por exemplo, Irreversible é um filme muito cru e, ainda assim, extremamente charmoso criticamente. Esse filme sérvio parece beber da fonte da novidade, mas não devolve algo novo a quem vê o filme, infelizmente.

22 de nov. de 2011

Drive

Drive. EUA, 2011, 100 minutos, thriller. Diretor: Nicolas Winding Refn.
Um filme de refinamento que, na sua arte contida, parece oscilar entre o muito bom e o apenas satisfatório.

Mal o filme foi lançado e há diversos rumores a respeito dele: talvez conquiste várias indicações nas próximas temporadas de prêmios, talvez dê a Ryan Gosling a sua segunda indicação ao Oscar, entre outros assuntos. Mas, sobretudo – e não se trata de um boato –, o filme tem sido considerado como um dos melhores lançados recentemente, ocupando, até a data de escrita dessa resenha, a centésima trigésima sétima (137ª) posição entre os 250 melhores filmes listados pelo IMDB.

A história do dublê anônimo de Hollywood nos é contada pouco a pouco: a sua profissão, a sua relação com uma vizinha e com o filho pequeno dela, por quem passa a desenvolver um carinho especial, o seu trabalho nas horas vagas, como mecânico – e principalmente a sua escolha por ajudar o marido ex-prisioneiro de Irene, a vizinha, que, devido às dívidas contraídas na prisão, deve pagar o que deve a fim de manter sua família viva.


Sabemos pouco a respeito desse stunt man – nem sequer conhecemos seu nome. Sabemos que ele é muito bom no que faz, seja como dublê ou como motorista para assaltantes, que é outro trabalho que ele esporadicamente faz. E ele afirma que não carrega armas, logo não mata ninguém. Mas essa é uma afirmação que se mostrará falsa ao longo da trama, já que ele eventualmente acaba sendo obrigado a dar uns tiros ou até mesmo pisotear brutalmente a cabeça de um indivíduo. A história, no entanto, não se foca exclusivamente nessa situação brutal pela qual ele passa; vemos também o desenvolvimento da relação dele com Irene, que, qual ele, se envolve e cria expectativas em relação àquilo que poderão viver juntos.

Não nego que haja no filme algo de requintado. A direção de Refn me parece lenta e cansativa demais, no entanto os elementos presentes em cena, bem como a atuação de Gosling ou a fotografia do filme são realmente impressionantes. Quando penso no filme em fotografias – numa série de quadros sendo apresentados e assim criando a narrativa –, eu o enxergo maravilhoso, decerto uma das melhores obras que o cinema já apresentou. No entanto, vê-lo em movimento, vendo acontecendo linearmente, numa velocidade que, em oposição a si mesma, é antiveloz, me incomodou bastante, principalmente porque isso me deixou em dúvida quanto ao que o filme pretende mostrar.

Não sei exatamente o que me incomodou. O roteiro parece conciso no que diz respeito ao envolvimento entre Irene e o personagem principal, no entanto me pareceu muito desnecessariamente extenso quando se refere àquilo que parece ser o “tema” do filme. Assim, nem o refinamento da câmera de Refn recupera o prolixidade do desenvolvimento da trama, que, pouco a pouco, parece se ensimesmar e mostrar pouquíssima coisa nova ou relevante.

Aí vejo tantos cinéfilos adorando o filme, cultuando-o como uma das mais recentes jóias do cinema. Não sei como me posicionar, já que, como disse, penso que o filme oscile bastante e que, no final, seja simplesmente interessante, mas nada que realmente faça com que você se impressione. No máximo, poderia apontar a atuação de Ryan Gosling como essencial para o que há de marcante nessa obra, mas, mesmo assim, considerá-la como uma promissora candidata ao Oscar 2012 me parece meio precipitado.

20 de nov. de 2011

Amizade Colorida


Friends with Benefits. EUA, 2011, 109 minutos, comédia romântica. Diretor: Will Gluck.

Mais um desses tantos filmes de comédia romântica que não trazem nada novo e, no caso desse, nem sequer causa tanto divertimento.

Nunca neguei que gosto de comédias românticas, que gosto de vê-la e que, muitas vezes, me entretenho bastante com elas, como é o caso dos filmes Pretty Woman (1990), How to Lose a Guy in 10 Days (2005) e The Proposal (2009). É claro que eu sei que há características já consolidadas que acabam perturbando o desenvolvimento e a originalidade dessas obras, já que, como sabemos, por exemplo, à exceção feita por Prime, o casal sempre acaba junto no final, não importando por quais problemas tenham passado.

Dizer que é justamente isso que acontece no filme não é spoiler, embora, honestamente, eu me senti realmente tentado a acreditar que veria algo que, mesmo não fugindo das “regras” do gênero, fosse novo n história de Jamie e Dylan, que se conhecem devido ao trabalho dela, que procura talentos para trabalhar em empresas famosas. Não conhecendo ninguém em Nova Iorque e estando Jamie à sua disposição, Dylan acaba propondo a ela, depois de algum tempo de contato, que eles se tornem fuck buddies – ou seja, amigos que fazem sexo. Ela, assim como ele, tinha saído de um relacionamento frustrado, logo não vêem problema nessa nova relação e acabam gradualmente se envolvendo.


Qualquer pessoa que conheça o paradigma do gênero saberá as coisas pelas quais esses personagens passarão: vão se aproximar por causa de alguma eventualidade da vida que os obrigará a passar bastante tempo juntos, encontrarão afinidades um com o outro, desenvolverão um crescente sentimento ao longo de um tempo relativamente curto que passarão juntos, passarão por um momento de discussão tensa, a qual resultará num afastamento breve e, por fim, no grand finale, eles ficarão juntos, esquecendo-se completamente das dificuldades – normalmente comportamentais – pelas quais passaram e assumirão que as provações unicamente serviram para mostrar o quanto foram feito um para o outro (e não para mostrar que, talvez, em oposição àquilo que eles pensam, não foram feitos um para o outro).

Acrescentem algumas cenas de sexo, algumas tentativas frustradas de efeito cômico – como a cena em que Dylan urina sentado e, questionado por ela, ele se justifica parcamente –, alguns momentos de apelação para relações familiares como forma de complementar o que é ausente nos personagens – e temos Friends with Benefits, uma obra bastante rasa que consegue se juntar ao rol dos filmes ruins do gênero. Vale notar que as comédias românticas normalmente não apresentam nada verdadeiramente novo e dificilmente trazem consigo alguma nova perspectiva quanto ao cinema; na maior parte das vezes, são filmes medianos e razoáveis, que satisfazem por uns momentos, naqueles nos quais não buscamos nada complexo, mas que dificilmente se tornam inesquecíveis pelo seu primor técnico ou artístico. Esse filme de Will Gluck consegue ficar abaixo da linha do razoável – o que é, a meu ver, bastante tenso, já que não é muito difícil fazer com que se filme caiba no amplo grupo dos apenas regulares e totalmente inverossímeis. E a inverossimilhança, às vezes, agrada. Ou vão dizer que a história cinderelesca de Vivian e Edward, de Uma Linda Mulher, seja desagradável ao olhos e à percepção do espectador?

Justin Timberlake e Mila Kunis são simpáticos e isso é inegável. Há neles algum charme, mais nela do que nele, evidentemente, mas mesmo isso não é suficiente para segurar a atenção nesse filme. Aliás, a falha principal está no roteiro, que não desenvolve nada, não mostra nada que não seja repetição. É um problema – como lidar com relações sexuais casuais sem se envolver emocionalmente? – que é repetido sem explicações maiores ao longo do filme o tempo todo. De um modo geral, só chatice e enrolações, que irritam demais e que fazem com que esse filme seja, em qualquer um de seus aspectos, extremamente dispensável.

18 de nov. de 2011

Pânico 4

Scream 4. EUA, 2011, 111 minutos, suspense. Diretor: Wes Craven.
Para mim, embora o primeiro filme da série seja interessantíssimo, é a sua terceira sequência que me cativou, justamente por causa da sua abordagem metalingüística que consegue resumir em si tudo o que foi dito nos filmes anteriores.

"Não mude o filme original!" - Sidney Prescott

Começo afirmando que eu sou um fã da franquia iniciada por Wes Craven e Kevin Williamson e que minha resenha será carregada de uma quantidade notável de amores, já que Scream foi um dos filmes de terror que mais remetem à minha infância (só pra constar, à época do lançamento do terceiro filme, em 2000, eu tinha 9 anos de idade). Confesso que fiquei surpreso e temeroso quando soube de um quarto filme: se o terceiro, embora agradável para mim, já não era mais tão interessante quanto o primeiro, o que esperar então de um quarto filme?

De algumas coisas, eu já sabia: Sindey Prescott seria mais uma vez alvo dos assassinatos, Gale e Dewey estariam ali para ajudá-la e, no caso de Gale, ajudar a si mesma também. Assim, restava conhecer o outro núcleo da história, já que evidentemente haveria um grupo a ser perseguido, além dos protagonistas da trama. Assim, conhecemos Jill, prima de Sidney, e seus amigos, que serão também perseguidos e mortos, como ocorreu em todos os filmes anteriores da série.


Primeiro, acredito que as interpretações são muito boas, principalmente no que diz respeito ao modo como os atores continuam em seus personagens. Aliás, não sei bem se isso é algo bom para eles, pois me parece que eles, afinal, nunca saíram desses personagens já que nunca interpretaram – a exceção fica por conta de Courtney Cox-Arquette – personagens tão importantes quanto os que viveram na até então trilogia Scream. Também acho válido apontar que os personagens conseguem realmente nos satisfazer – pelo menos aos espectadores como eu, mais saudosistas –, uma vez que remetem mesmo àquilo que eles sempre foram: Sidney, embora pacífica, é bastante bruta quanto precisa; mesmo amedrontada, continua vívida e racional em suas ações. Dewey, por sua vez, é uma versão melhorada do que ele era no primeiro filme, mas, ainda assim, está bem longe de ter a esperteza e sagacidade de Gale, que, estando arruinada em sua profissão, resolve voltar às suas origens de jornalista sensacionalista e inescrupulosa e, juntando-se a dois estudantes fanáticos pela tecnologia, mostra que não aceita estar por baixo.

Como soubemos aos assistir aos filmes anteriores e como sabemos pela explicação nesse roteiro: a série é extremamente metalingüística e fala sobre o gênero terror ao longo de todo o seu desenvolvimento. Assim, em Scream (1996), conhecemos as regras básicas para sobreviver num filme de terror; em Scream 2 (1997), são apresentadas, dentro do filme, as características típicas de uma continuação; já em Scream 3 (1997), apresentam-se-nos os emblemas fundamentais da última parte da trilogia. Mas, como é dito em Scream 4, datado desse ano, com a vinda do novo milênio e com as novas focalizações cinematográficas dentro do gênero horror, devemos nos ater aos remakes – e é justamente a respeito disso que o filme de Craven falará. Percebemos que há a existência do duplo, criando assim uma especificação temporal no tempo presente, mas também remetendo à película de 1996: Jill é a representação de Sidney; Charlie e Trevor são o dobro de Gale Weathers; Judy Hicks, policial que trabalha com Dewey se mostra como seu duplo; Kirby corresponde à melhor amiga da protagonista, que no original correspondia a Tatum. Eis presente a metalinguagem que permeou toda a série proposta por Craven.


Do que mais gosto no filme é justamente a questão da personagem duplicada, que nos remete temporalmente ao que a pessoa é e àquilo que ela foi. Indubitável que o efeito conquistado é ótimo: estamos assistindo, ao mesmo tempo, à produção de 1996 e à produção de 2011 – embora quinze anos separem os dois filmes, vemo-los juntos aqui acontecendo em concomitância, embora já os tenhamos visto também em concatenação. E ao longo de todo o filme, há espaço suficiente para que ocorram assassinatos violentos, dúvidas muitas a respeito de quem pode ser o assassino (com destaque à dúbia personagem de Marley Shelton, que, numa única cena, consegue nos colocar uma dúvida que nos perseguirá até o final), até espaço para algum romance entre Charlie e Kirby, vividos pelo estranho Rory Culkin e Hayden Panettiere, mais famosa como Claire, do seriado Heroes. E, como se não bastasse as relações com o primeiro filme, há relações fundamentais que provêm respectivamente dos segundo e terceiro filmes, que são os filmes Stab, os famosos movies within a movie que se verificam a partir da primeira continuação de Pânico. É justamente com uma referência aos filmes Facada que Pânico se inicia: uma evidente crítica ao sensacionalismo desvairado que faz com que os filmes de terror recebam continuações exageradas, independentemente daquilo que será mostrado no roteiro que, diante da necessidade de acumular mais dinheiro, acaba ignorado quase que totalmente, fazendo com que, como dito no filme, possa haver até viagem no tempo num filme como Stab que é, como se nota, o duplo de Scream. Só para constar: é um extremo deleite as participações breves de Anna Paquin e Kristen Bell – bastante conhecidas pelos seriados True Blood e Veronica Mars.

Creio que o desenvolvimento do filme seja realmente interessante, principalmente por causa da sua dinâmica, que ajuda muito a prender a atenção. A somar, aqueles velhos truques de fazer pensar que é uma pessoa para ser outra, assim como o encurralamento de uma personagem, o modo assombroso como o ghost face se projeta ao longo de toda a obra – afinal, ele pode e parece estar em qualquer lugar. Isso para não citar o momento de revelação que, na minha opinião, foi muito interessante, justamente por mostrar-se outra abordagem do duplo – e desta vez, não apenas no sentido de “personalidade duplicada”, mas, num sentido mais técnico do recurso abordado constantemente na literatura, verifica-se a oposição de personalidade. E isso somente torna o filme mais interessante!

Que eu sou fã das obras de Craven vocês já devem saber. Desde o seu primeiro filme, The Last House on the Left, de 1972, a sua produção dentro do horror é bastante interessante, mesmo que haja, às vezes, umas falhas, como é o caso de New Nightmare, de 1994. Pânico 4 é um bom entretenimento e, honestamente, penso que seja uma boa continuação da série; muito válido e divertido além de possuir uma abordagem inteligente a respeito de si próprio e dos remakes. Aliás, a respeito da primeira regra deles, Sidney Prescott dá um aviso muito importante: don’t fuck with the original [movie].

16 de nov. de 2011

Reféns

Trespass. EUA, 2011, 91 minutos, thriller. Diretor: Joel Schumacher.
Um verdadeiro filme-bomba com história duvidosa, desenvolvimento confuso, um ator em atuação sofrível, uma atriz que não se sabe por que está ali e mais uma série de elementos que apenas irritam o espectador em vez de entretê-lo.

Sou fã de Nicole Kidman e não nego isso. Mesmo que ache que a produção pode ser estranha, como é o caso de A Feiticeira, eu ínsito em vê-la mesmo assim, talvez eu acabe surpreso e, pensando nisso, acabo me deparando com filmes-bombas, como é o caso desse. Não fui ao cinema inocentemente - afinal, embora estivesse interessado em Nicole Kidman, também estava consciente de quem era o lead actor e de quem era o diretor - e, honestamente, não sou muito fã do trabalho de nenhum deles.

Ao ler a sinopse, já pude imaginar as coisas que surgiriam ao longo do tempo em que Kyle e Sarah fossem mantidos presos como reféns de um assalto à casa deles: decerto haveria momentos de extremamente fragilidade nos quais os personagens relevariam segredos que perturbaria ainda mais a situação na qual se encontravam; também previ grandes palavras de amor, ditas de um personagem a outro; sendo isso pouco, assumi que haveria alguma identificação amorosa ou afetiva de um assaltante para com um personagem, como acontece em The Panic Room. E, tão previsível que esse filme é, há exatamente tudo isso que eu citei e, infelizmente, esses elementos não servem para muita coisa nessa trama, que pouquíssimo informa e que apenas mostra atitudes estranhas e incoerentes por parte de todos os personagens.

 Nicole Kidman na verdadeira relação-problema que dá mote a esse filme ruim.

Aliás, os personagens. Esses merecem um foco especial, porque eles são figuras realmente misteriosas nesse filme, tão misteriosos e obscuros que suas atitudes beiram a estupidez de qual modo que transcende ela própria - a estupidez. Não há como entendê-los e, conseqüentemente, não há como simpatizar com algo tão prepotente como Kyle (mas isso também se deve à má atuação de Nicolas Cage), assim como é impossível simpatizar com Avery, a filha do casal, ou com Sarah. O mais interessante é perceber uma das cenas iniciais, assim que começa o assalto: Kyle é agredido e imediatamente grita para Sarah correr. Subentende-se: “não venha pra cá, corra pra fora da casa”; ela, evidentemente, não faz isso e acaba correndo em direção aos bandidos, que a pegam. Tudo bem, pensamos, um erro de principiante; ela, afinal, não imaginaria que lhe houvessem invadido a casa e capturado seu marido. Depois, quando a filha chega inesperadamente de uma festa, os bandidos a seguram também como refém, e isso aumenta os instintos de proteção de Kyle e Sarah, que parecem dispostos a inverter a situação. Sarah, oportunamente - embora numa cena que não se entende o porquê da existência -, rouba uma seringa contendo uma anestesia extremamente poderosa, em quantidade suficiente para matar. Aí, ela consegue fazer de um dos bandidos seu refém somente para liberá-lo dois minutos depois enquanto nós nos perguntamos por que diabos ela fez aquilo. A resistência de Kyle em abrir o cofre, no qual não há nada, é outro mistério - por que não mostrá-lo logo e dar a desculpa já no começo, evitando toda a agressão pela qual passariam?

O roteiro de Karl Gajdusek realmente não se preocupa em tornar nada coerente. É um dos filmes mais incoerentes a que já assisti. Difícil entender o gosto dos personagens por correr na floresta que cerca a casa, difícil entender a mulher que auxilia os bandidos, já que ela se comporta escrotamente ao longo de todo o filme, não entendi o uso da seringa que deveria matar e não mata, as várias vezes em que os bandidos se agridem sem motivo, as tentativas de romance que surgem aqui e lá, principalmente envolvendo Sarah e um dos bandidos, qualquer que seja. Tenho certeza de que esse roteirista escreveu tudo isso só de brincadeira, porque, desde o princípio, percebeu o tom de brincadeira desse filme de Schumacher (aliás, conhecendo o diretor, já se pode facilmente supor que será bem em tom de brincadeira o filme). O único problema é que o espectador é o último a perceber que essa obra não deve ser levada a sério.

 Uma das muitas cenas repetidas do filme.

O problema de Nicole Kidman não é sua má atuação, até porque ela está bastante coerente dentro do possível (com exceção das cenas em que finge ser lutadora ou em que corre pelo mato). O problema é unicamente a sua presença nesse filme - ela não deveria estar ali, evidentemente, principalmente num momento de sua carreira na qual assumimos que ela, por fim, deu a volta por cima, ainda mais com a recente indicação ao Oscar pelo magnífico Rabbit Hole. Liana Liberato e Cam Gigandet apenas estão ali, em atuações no automático, fazendo o mínimo que se espera deles, sem, no entanto, apresentar deficiências notáveis no seu trabalho. Nicolas Cage é o verdadeiro trunfo ao inverso de Trespass - é ridícula sua atuação, uma das coisas mais medíocres e infelizes que vi ultimamente, tudo nele está errado, infinitamente errado: vejam a cena em que ele perde os óculos, vejam quando ele leva um tiro na perda, quando é arrastado para fora da casa no final do filme, abomino tudo o que vi!

Joel Shumacher (risos desde já) realmente nos ofereceu um verdadeiro presente de grego, que consegue ser ainda mais notável do que o desastre Batman and Robin, o qual ainda pode ser considerado um filme divertidinho. A sua direção poderia facilmente ser apontada como uma das piores de 2011, porque ele conseguiu reunir sofrivelmente inúmeros problemas. Aqueles flashbacks são tenebrosos, assim como a edição que sobrepõe o rosto de um personagem a uma cena qualquer, como se isso acrescentasse drama ou ritmo a tudo de ridículo que estamos assistindo. Fiquei impressionado com esse filme, tanto que ele me motivou a conhecer mais títulos dirigidos por esse diretor que, honestamente, tanto me incomoda, já que ele próprio, como acontece aqui, não consegue oferecer aquilo que propõe.

14 de nov. de 2011

Contágio

Contagion. EUA, 2011, 106 minutos, drama. Diretor: Steven Soderbergh.
A dose de realidade presente na obra é simplesmente assustadora e creio ser esse o elemento que mais chama a atenção do espectador.

Me lembro de que assim que comecei a ouvir rumores a respeito desse filme, ouvi que se tratasse de uma obra sobre zumbis. E achei curioso pensar no enredo, já que o elenco todo parecia destoar desse subgênero de filmes. E eu estava correto ao supor haver erro nesses boatos: a história aborda uma epidemia viral desconhecida, da qual se desconfia a origem, mas não se sabe muitas informações a respeito. A única informação realmente necessária é que a infecção é altamente contagiosa e que a busca por uma solução deve ser imediata.

Há uma série de filmes que abordam situações apocalípticas, mas a que se vê nesse filme é absurdamente assustadora. Por uma série de motivos, as populações se vêem lacradas em suas cápsulas governamentais, que são uma série de histórias ditas às pessoas com uma infinidade de razões. E, à primeira vista, não fôssemos nós observadores dessa história, poderíamos facilmente dizer que a doença apresentada no filme é, em suma, uma forma de criar o caos nos povos e, assim, colocá-los sob a proteção do Estado, tornando-os mais submissos às formas várias de pressão que se mostram na sociedade. Também, se não descobríssemos como tudo aconteceu, poderíamos suspeitar de ataques terroristas com armas biológicas, pois, não se pode negar, a questão política é extremamente relevante para grupos partidários a ponto de eles agirem com atitudes extremistas a fim de provar-se superiores.

A história assusta porque ela é real. Simplesmente por isso. Vemos a contaminação de várias pessoas e também vemos os dois lados presentes: o das populações, que clamam por ajuda, que esperam ser ajudadas e, no desespero, assumem estar abandonados ou pensam que não é dada a eles a devida atenção; e o lado dos cientistas, que buscam lidar com as dificuldades de um elemento danoso que eles não conhecem e, a somar, com o modo com a qual cada notícia deve ser divulgada, de modo a não causar mais caos do que aquele que já se vê nas ruas. A tensão conflituosa do filme se dá nesses dois âmbitos e assim vemos as situações, por exemplo, de Mitch Emhoff (Matt Damon) e sua família e de Alan Krumwiede (Jude Law), que representam a questão social, e de Dr. Ellis Cheever (Lawrence Fishburne), Dr. Leonora Orantes (Marion Cotillard) e Dr. Erin Mears (Kate Winslet), que representam o posicionamento científico.

A obra está bastante longe de ser um retrato pacífico de um período conturbado. Vemos a todo momento situações de instabilidade, de denúncia, de crises e violência. O que se vê no filme é, em maior escala, aquilo que nós passamos em 2009, quando a chamada “gripe suína” aterrorizou as pessoas e, no caso do Brasil, impediu o funcionamento de escolas, de instituições públicas, e encerrou as pessoas em suas casas. Verifica-se, nesse filme, que, às vezes, nem ficar em casa é suficiente para evitar o contágio e, mais interessantemente ainda, todos podem se contaminar e sucumbir. Muitas cenas são cruéis no que mostram e o narrar com determinação temporal é ainda mais desesperador: a associação da doença e da morte com o tempo – sendo o número de mortos proporcional ao tempo passado – é tenebrosa e nos remete mais ainda à idéia da realidade bruta que estamos acompanhando.

Não nego que o elenco seja de peso, mas a força do filme não está nas atuações. Seu poder reside na sua crítica à irracionalidade humana e também no esforço humano – lembrando: o filme mostra os dois lados da mesma situação; vemos tanto os que combatem o caos quanto aqueles que, através do sensacionalismo, criam o desespero como forma de arrecadar com isso. Não nego, porém, que o elenco é fundamental para o desenvolvimento da obra, embora, penso, que os atores poderiam ser utilizados de uma maneira melhor dentro do roteiro, que, às vezes, simplesmente se esquece deles, como se vê facilmente com Marion Cotillard, que, a partir de um determinado momento, simplesmente some na trama e não lhe é dada qualquer atenção, sendo o seu final uma incógnita.

Não me estenderei no quesito atuação, porque realmente não está aqui a força do filme, ainda que os atores, de um modo geral, estejam cabíveis em seus personagens e não se destacam de modo algum negativamente. Se há aspectos ruins quanto a eles, decerto reside na direção ou no roteiro, mas não em seus trabalhos. Quanto à direção, aliás, é interessante notar que Soderbergh parece finalmente ter composto algo mais parecido com um “filme do Soderbergh”, como aqueles dois que vimos em 2000 – Erin Brokovich e Traffic, mais a esse do que àquele. Se ele voltou a criar bons filmes, que se mantenha assim, a fim de não desaparecer como fez na última década, na qual mal ouvimos falar dele.

Contagion é um filme um pouco extenso desnecessariamente, mas, ainda assim, consegue eficientemente transmitir sua mensagem, mesmo havendo nele algumas falhas e desvios que interferem numa apreciação máxima. O filme vale, no entanto, pela sua sobriedade e funcionalidade ao retratar a situação caótica à qual as pessoas são submetidas. E também vale, sobretudo, pela última cena, quando descobrimos o que aconteceu no Day 1.

12 de nov. de 2011

Amor à Toda Prova

Crazy, Stupid, Love. EUA, 2011, 118 minutos, comédia. Diretores: Glenn Ficarra e John Requa.

O roteirista e os diretores conseguiram transformar uma história singela em diversão com qualidade absurdamente superior a das diversas comédias românticas lançadas anualmente.


Ao ver notícias sobre esse filme, duas coisas rapidamente me passaram pela cabeça: “quero vê-lo”, pois no elenco está a belíssima Julianne Moore, atriz cujo trabalho eu admiro bastante, e “não quero vê-lo”, pois no elenco também está Steve Carell, um ator que, até essa atuação, ao meu ver, só esteve em uma obra interessante, que é Little Miss Sunshine. Se o visse e o achasse ruim, eu teria pouco a perder, então decidi conferi-lo.

E sorte que o fiz, porque a história é cativante e a sua singeleza envolve o espectador na desventura amorosa de Cal Weaver, um homem que, após ser deixado pela esposa, que revela tê-lo traído, ele se sente tão frustrado que passa a beber todas as noites num bar enquanto conta o seu problema amoroso. Lá conhece Jacob Palmer, um jovem bem sucedido que conquista todas as mulheres e que é, efetivamente, a representação da masculinidade. Palmer, então, decide ensinar Weaver a se valorizar e a recuperar a auto-estima, tornando-o, então um homem bastante seguro, o que, na verdade, não modifica o que ele ainda sente pela ex-esposa e nem faz com que ele deixe de se envolver em algumas confusões, principalmente quando ao seu redor estão o seu filho adolescente que é apaixonado pela babá, a babá que é apaixonada por ele (por Cal) e a ex-esposa, que o ama, mas que já não consegue se manter nem longe nem próxima dele.

Quando penso nas comédias românticas, penso sempre no arquétipo das situações-problemas que é apresentado. Dificilmente vemos algo que seja diferente de uma modelo já consolidado: o problema inicial, os conflitos pessoais que seguem humoradamente e, por fim, a solução com a união do casal principal. Crazy, Stupid, Love consegue justamente se afastar disso ao tornar os personagens e situações mais verossímeis, mais palpáveis e menos fantasiosos. Os problemas enfrentados por Cal e Emily são reais e os dois lidam com isso de forma real. Interessante notar a preocupação de Dan Folgeman, o roteirista, em não torná-la monstruosa – ela é simplesmente uma mulher que não consegue mais estar num relacionamento que não a motiva a continuar. Cal, por sua vez, por ter estado exclusivamente com Emily, não encontra em outra mulher razão para se envolver. Personagens completamente compreensíveis, bastante naturais e, sobretudo reais.

A somar, há mais a dizer sobre os personagens. Basta pensar no título principal para termos uma idéia do quanto as pessoas retratadas nessa filme são complexas: elas vivem momentos de loucura (abandonar um casamento de mais de vinte anos, tornar-se garanhão de repente), momento de estupidez (o modo como agem sovinamente, degradando a convivência em função de mesquinharias pessoais) e, indubitável e principalmente, momentos de amor – isso se verifica em todos os personagens e nas diversas relações vistas: amor conjugal, paternal, fraternal; mesmo entre Cal Weaver e Jacob Palmer se vê uma relação se amizade intensa, a qual, embora se abale – a estupidez aí –, não morre. Esse panorama da complexidade comportamental dificilmente é apresentado em outros filmes de comédia, que se limitam a personagens planos em situações unilaterais.

O lado cômico do filme se encontra basicamente nas personagens de Ryan Gosling, o qual, aliás, está bastante sedutor, e em Hannah, interpretada por Emma Stone. É claro que existem muitos momentos em que o humor se evidencia, podemos vê-lo claramente na personagem de Marisa Tomei, cuja participação é pequena, mas garante entretenimento. A escolha por intercalar momentos dramáticos e momento cômicos foi certa, isso evitou que o filme ficasse carregado, seja num gênero ou no outro – é interessante, sobretudo, perceber que a linha que separa o drama do humor é muito tênue: basta observar, por exemplo, as cenas nas quais Emily e Cal conversam no jardim, quando ela comenta que foi assistir Twilight, e quando eles saem da reunião com Kate, professora ex-alcoólatra do filho deles.

Acredito que outro fator positivo seja a dedicação dos atores. Todos estão confortáveis, mesmo Kevin Bacon, que é meio canastrão, se encontra à vontade na sua personagem. Os destaques vão evidentemente para Julianne Moore e Ryan Gosling, ambos enriquecem o filme com a sua presença. Muitas comédias são lançadas, mas poucas trazem consigo um bom elenco, um roteiro conciso e atrativo, uma direção eficiente e, ainda, um desenvolvimento – este ligado principalmente à direção – que percorre duas horas sem se deixar afetar pelos pequenos defeitinhos que existem ao longo de toda obra. Trata-se de um filme que diverte e se faz notável dentro do gênero.

10 de nov. de 2011

Água para Elefantes

Water for Elephants. EUA, 2011, 115 minutos, drama. Diretor: Francis Lawrence.
A história água-com-açúcar consegue engambelar com beleza e carisma e ainda traz Christopher Waltzem numa interpretação vivaz.

Pode-se dizer que Water for Elephants é um daqueles filmes que já causam alvoroço antes mesmo de sua estréia. Assim como inúmeros outros títulos lançados anualmente, esse filme causou furor em basicamente dois grupos: o das garotas que adoram Robert Pattinson e que vivem em função de conhecer e adorar todas as obras desse ator; e o dos esperançosos, que viam em Witherspoon e em Waltz – e em Pattinson, quem sabe – a possibilidade de uma grande obra cinematográfica.

Creio que ambos os grupos foram favorecidos, pois o filme, que fala sobre o período em que Jacob Jankowski esteve acompanhando uma trupe, consegue agradar sem apelações e sem delongas desnecessárias que perturbam a exibição de um filme. A história acompanha a narrativa de um senhor, que nos a respeito do seu passado quando, desistindo da universidade na qual cursava medicina veterinária, escolheu viver acompanhando um circo – lugar que foi responsável por grandes lições de vida.

 Christopher Waltz e Reese Witherspoon no momento em que August apresenta Rosie, o elefante, à Marlena

O período histórico-político em torno do qual a história se localiza é justamente o começo da década de 1930, quando os EUA ainda está extremamente afetado pela quebra da bolsa de valores. Assim, pessoas estão endividadas, esfomeadas e desempregadas – e é a combinação desses e de outros fatores que faz com que mais de 300 homens sigam viajando de cidade em cidade num trem para conseguir pagamento de alguns centavos por dia de trabalho escravizado. Jacob, sem dinheiro e sem família – um acidente matou os seus pais e, por causa da hipoteca da casa, o banco assumiu os bens dos Jankowski –, o jovem é obrigado a buscar um meio de sobreviver. Acaba, assim, integrando a equipe dos Irmãos Benzini.

Sabendo o arquétipo básico de histórias como essa, podemos prever facilmente o que vai acontecer: Jacob vai se apaixonar pela mulher do dono do circo, nesse caso, Marlena, interpretada por Reese Witherspoon, e August, vivido por Christopher Waltz. Tendo estabelecido o triângulo, resta apenas aguardar pelas complicações. Quanto à problemática da temática, não sei bem se a considero boa ou não. Se assumir o tom cinematográfico, diria tratar-se um encadeamento meio pobre, já que os conflitos são bastante delimitados e encontram praticamente nas reações bruscas de August em relação a como ele lida com os empregados e animais do circo. Se vir através de um tom cronista, aí parecerá extremamente adequado, pois o retrato que se faz é mais da relação tensa profissional e comportamental de August do que afetivo-amorosa de Jacob e Marlena. O romance se evidencia, mas calmamente e em segundo plano. Os mais românticos decerto acharão que falta emoção; para mim, estava na medida certa, sem dramalhões inconvenientes.

 Momento catártico do filme: o novo recomeço de Jacob e Marlena, ao lado de Rosie
O ritmo do filme é lento. Acompanhamos com calma o que há para ser mostrado. Vale notar que a obra não quer apenas expor o enredo, mas também encantar artisticamente – e devo dizer que eu me senti atraído pela abordagem estética da obra: a fotografia é bonita, o contraste da beleza quase clássica de Marlena com a selvageria em torno da qual ela está se insinua o tempo todo. Até mesmo a animalização de August – que se torna mais animal instintivo do que qualquer outro animal irracional – contrasta com a sutileza vivida pelos protagonistas e pelo ambiente circense. Francis Lawrence tem uma direção modelada, dessas que estão na cartilha. Momentos de slow-motion, algumas repetições de cenas como ênfase – nada errado, no fim, mas bastante comum e sem nenhum diferencial.

Penso que seja Christopher Waltz o ponto auge do filme. Sua atuação é marcante, mesmo nos mínimos detalhes, mesmo nos momentos mais rápidos. É o modo como olha e como usa os olhos como fonte máxima de expressão. Não me surpreenderia que concorresse a prêmios por sua atuação. Reese Witherspoon traz consigo algo de caricato. Não sei exatamente explicar nem considero ruim a sua interpretação. Mas, assim como a direção de Lawrence, parece que ela pegou algumas expressões de outras atuações, seja dela mesma ou de outras atrizes, e as usou para compor Marlena. Nenhum grande problema – nem mesmo com Robert Pattinson, ator que, honestamente, eu considero bastante canastrão. Não creio que ele atue nessa obra. Algo me diz que são outros fatores presentes na produção que causam a impressão de que ele, às vezes, sorri ou se desespera convincentemente. 

Com exceção de Waltz, a força do filme está longe da área das interpretações. Acho que está na sua beleza. Por mais que não seja um filme memorável, é uma obra que cativa ao seu modo, que mostra uma beleza que, durante a exibição e por um tempo depois dela, prende os olhos do espectador. Não chega a ser um guilty-pleasure, porque reconheço bastantes qualidades – fotografia, figurino, direção de arte –, mas é uma dessas obras cujo charme está aparentemente além do próprio filme. Talvez esteja até mesmo na receptividade do espectador...

8 de nov. de 2011

Larry Crowne - O Amor Está de Volta

Larry Crowne. EUA, 2011, 98 minutos, comédia. Diretor: Tom Hanks.
Estamos diante de um filme sem foco, aparentemente sem roteiro, com atuações medianas e que só se mantém pelo carisma de Julia Roberts, que está bonita, mesmo quando se mostra extremamente amarga.

O que motivou a assistir a esse foi justamente a presença de Julia Roberts, que, mesmo em filmes medianos, consegue cativar a minha atenção. E é justamente assim com esse filme, dirigido por Tom Hanks e também co-protagonizado por ele. Conhecemos a história de Larry Crowne, que é despedido após trabalhar muitos anos numa rede de supermercados. O motivo: não possuir ensino superior - o que, segundo os chefes, prejudica a empresa, já que impossibilita o seu crescimento. Larry então decide matricular-se na universidade local, onde, no curso de Oratória 217, conhece Mercedes, uma professora desmotivada com a profissão e com seu casamento.

A primeira dificuldade básica nesse filme é encontrar o seu foco. São muitas histórias acontecendo e todas elas buscam intensificar a história de Larry, mas, como vemos, dificilmente percebemos o desenvolvimento delas, já que elas, por serem muitas, não encontram espaço para se mostrarem vívidas na trama. A começar, temos aquilo que parece ser o tema do filme: o romance entre Mercedes e Larry. Percebemos essa relação de afeto pelo modo como ele sutilmente modifica a personalidade brusca dela e pelo modo como ele faz com que ela, pouco a pouco, passe a querer estar em sala de aula ou, até mesmo, queira ser mais gentil com os outros. Isso, no entanto, não se desenvolve bem e cabe apenas ao espectador compreender essas mudanças - na verdade, o máximo que vemos são mudanças mínimas no comportamento dela e isso é repetido exacerbadamente ao longo da história. 


Ainda, além do que parece ser o plot principal, temos ainda outras três temáticas que são apresentados: a vida pessoal de Mercedes e o seu relacionamento conturbado com seu marido, que parece não lhe dedicar a atenção que ela requer, o que, por conseqüência, cria uma série de desencontros entre eles, culminando na reprovação da atitude de um por parte do outro e vice-versa; também conhecemos a relação estabelecida entre Larry e Tália, que o nomeia Lance Corona, já que, segundo ela, “Larry” não é um nome que faz jus à pessoa que ele é; ainda há o problema entre Larry e ele mesmo, que passa por um processo de autoreconhecimento, no qual percebe que a sua vida havia sido bastante limitada e reduzida às coisas que ele acreditava ser “perfeitas” como o emprego aparentemente interessante que tinha na rede de supermercados.

Penso que seja essa série de desencontros que fazem com que o filme perca a sua potência. Não quero dizer que ele tivesse os elementos necessários para torná-lo uma grande, mas decerto há comédias românticas bem mais interessantes, que chamam bem mais a atenção do que esse título, justamente por se focarem em algo mais específico em vez de “atirar para todos os lados” como forma de tentar transformar a história em algo mais complexo. Isso evidentemente falha, porque faz com que a narrativa disperse e, a somar, os personagens se tornem mais superficiais do que eles seriam se seu enredo seguisse simplesmente a fórmula clássica dos filmes do gênero. Tália, Lala, Mercedes, Lance Corona e Larry Crowne são inferiorizados por um roteiro que não consegue adaptá-los ao espaço temporal de que o filme dispõe - uma hora e meia não suficiente para discorrer a respeito de tantos assuntos como Tom Hanks, o diretor e roteirista, e Nia Vardalos, co-roteirista, supuseram. 


E entre tantos problemas que o filme apresenta, a sua quase salvação está no elenco. Não me refiro especificamente à atuação de Tom Hanks, que, embora simpático, parecer ter perdido aquele charme delicado que havia nas épocas de Sleepless in Seattle e You’ve Got Mail, filmes que co-protagonizou ao lado de Meg Ryan. Eu falava mesmo a respeito de Gugu Mbatha-Raw, intérprete de Tália, e Julia Roberts, que dá vida à Mercedes Tainot - T-A-I-N-O-T, não Tainá, Tina ou Terry, como ela mesma diz. As duas atrizes carregam consigo tanta simpatia que vê-las em cena ajuda o filme, pois realmente nos sentimentos confortáveis ao vê-las. Em especial, adoro as cenas em que Mercedes Tainot demonstra a sua irritação com a vida, parecendo não haver nada que a agradasse.

Basicamente, é uma comédia sem muitos momentos de riso, que não apresenta nada novo, que não oferece ao espectador o carisma ilusório de pensar que no final tudo dá certo, mesmo que nesse filme tudo dê certo - percebamos: nem sequer somos convencidos por aquilo que o filme parece defender - a magia do amor. O único momento crítico da obra - e que não é mostrado com o tom crítico que lhe cabia - é justamente o fato de Mercedes dar nota A+ a Larry quando percebemos que isso evidentemente só aconteceu por causa da relação de carinho que ela tinha por ele. Ou seja, ela é uma professora desiludida, irritada, hostil que, quando se livra dessas características ruins, se torna antiética! Mas, enfim, acho que essa crítica não cabe ao enredo. Enfim, Larry Crowne é um filme que não surpreende nem entretém muito, mas vale a pena por Julia Roberts - que, como Julianne Moore, parece sempre fazer um filme se tornar assistível somente pela sua presença.