14 de jan. de 2012

Convite para um Homicídio

A Muder is Announced. RU / Irlanda, 1985, 153 minutos, mistério. Diretor: David Giles.

Um filme com um grande acerto e um grande erro, mas, apesar desse erro grotesco, uma obra que vale a pena ser conferida.

Honestamente não conheço muitos filmes baseados em livros de Agatha Christie. Acredito que o único anterior a esse a que eu já assisti foi “Assassinato no Expresso do Oriente” (1975), que rendeu a Ingrid Bergman o prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante e Albert Finney uma indicação como Melhor Ator. “Convite para um Homicídio” se trata, na verdade, de uma minissérie feita para a televisão britânica e exibida em três episódios de cerca de cinqüenta minutos cada.

Devo começar dizendo que duas coisas me chamaram muito a atenção nessa produção: a excelente adaptação, que conta com atuações estarrecedoras e que dão total credibilidade àquilo que vemos, e a outra - esta negativa - se refere à falta de ritmo e de esclarecimento nos momentos finais, que deveriam ser o ápice dessa trama de assassinato. Como o próprio título sugere, é feito um convite para um homicídio que haverá de acontecer em Little Paddocks às dezenove horas - um anúncio no jornal matutino diz que todos os amigos estão convidados, o que gera curiosidade nos vizinhos e faz com que todos vão ao local na hora combinada, pensando tratar-se de uma brincadeira - os donos da casa, inclusive, pensavam tratar-se de uma brincadeira e, curiosos e ansiosos, resolveram levar adiante aquela situação.

 Murgatroyd e Hinch, duas personagens que serão fundamentais para a resolução dessa trama.

Para a surpresa de todos - e também do espectador desavisado (leia-se: aqueles que não conhecem a obra literária) -, acontece mesmo um homicídio: depois que todos se reúnem na casa de Letitia Blacklocks, todos à espera do começo da brincadeira, as luzes se apagam e um homem mascarado invade a sala, ilumina as pessoas com uma lanterna extremamente forte e dispara três tiros, um dos quais fera a dona da casa e outro que acertou a ele mesmo, aparentemente tratando-se de um suicídio todo teatral. A brincadeira gera muita confusão: uns crêem que o homem apenas estava ali para fazer seu último espetáculo antes de se matar; outros acreditam que ele estava ali para matar Letitia (doravante Letty); e ainda há os que acham que ele não se suicidou, sendo aquilo uma armação para um assassinato que acabou dando errado e, então, ele foi morto com queima de arquivo.

O filme é dividido em três, sendo que o primeiro deles mostra o acontecimento em Little Paddocks e a investigação policial; o segundo mostra a entrada de Jane Marple, uma senhora idosa, mas extremamente perspicaz, que ajuda o investigador a colher mais informações; e, por fim, no terceiro momento conhecemos as pistas finais que levarão à conclusão - esta mal executada - da trama. É necessário dizer que as duas primeiras partes são muito bem desenvolvidas e o espectador as acompanha com extremo interesse e curiosidade aguçada. Os personagens que conhecemos são bastantes díspares: há Bunny, amiga de Letty, que reside com a amiga e que é extremamente faladora, com características extremamente sinceras; há os Swettenham: enquanto a mãe é inventiva e incoerente, dada aos exageros, o filho é reservado e partidário do comunismo, o que atrai a atenção para si; há o Coronel e sua esposa, sendo curiosamente dele a arma usada pelo invasor de Little Paddocks; há ainda Julia e Patrick Simmons, primos distantes de Letty, a quem ela veio a conhecer apenas recentemente; há ainda a mulher do pároco, mulher bastante sincera e sobrinha de Jane Marple; por fim, a senhorita Haymes, a jardineira da casa, e Hannah, a cozinheira refugiada e temerosa, que acha que todos a odeiam ou querem matá-la.

 Jane Marple: uma velhinha bem mais interessante do que a personagem pedante descrita nos livros.

Toda a investigação inicial chega a conclusão de que o homem invasor, Rudi Scherz, pretendia roubar, mas acabou cometendo suicídio quando viu a situação na qual se pusera. Tudo isso até o segundo ato, quando Jane Marple traz uma sugestão que a ela parece óbvia: o homem jamais estivera armado, fazendo com que ele não pudesse atirar em ninguém nem ao menos em si mesmo - alguém o matou. Quando questionada a respeito, sua explanação é bastante simples: com as luzes apagadas, as pessoas não podiam enxergar nada a não ser a fonte de luz, que, de tão forte, abobalhou-as por instantes - apesar de o homem ter gritado “Mãos para o alto, senão eu atiro” e de as pessoas terem ouvido tiros, esses são os dois únicos fatos, já que ninguém poderia ver-lhe as mãos para constatar que ele trazia consigo um revólver. Assim as investigações tomam novo rumo e o espectador adentra mais ainda aquele universo de estranha calmaria e iminente perigo, como concluímos conforme a história de desenvolve.

Creio que o melhor de tudo seja o elenco. Quando eu li o romance há algum tempo - na verdade, muitos anos atrás -, eu fiquei impressionado com Letty Blacklock e constantemente me perguntava como seria essa narrativa transposta para o cinema - e devo dizer que os personagens aqui vistos são exatamente como eu imaginei. O diretor tomou o cuidado de não permitir que qualquer ator fugisse das características dos personagens do livro, tornando todos bastante fidedignos. Penso, aliás, que aqui estejam os personagens mais fieis a um livro que eu já vi; jamais os imaginei senão do jeito que aqui são retratados. Destaque para Murgatroyd e para a própria Letty Blacklock, interpretadas por Joan Sims e Ursula Howells. Quanto às atuações, talvez o elenco jovem seja o mais problemático, já que alguns deles - a intérprete de Julia Simmons, por exemplo - parecem trazer consigo muitos cacoetes e acomodações nos personagens, sem nos mostrar nada novo. Mas, ainda assim, nenhum grande problema.

 Letty Blacklock: excelente adaptação do livro e interpretação magnífica da atriz.

Se a revelação, no livro, é simplesmente o momento mais interessante e, talvez, angustiante de toda a narrativa, no filme simplesmente vemos a oportunidade de um grande desenlace se perdendo devido à falta de ritmo e à falta de explicações convincentes, que simplesmente parecem ignorar ou dar pouca importância a elementos que são essenciais ao desenvolvimento do plano do verdadeiro responsável pelo “convite para o homicídio”. Quando digo isso, falo a verdade: somente sei como tudo aconteceu, porque me lembro bem do desfecho do romance literário, de outro modo, ficaria com uma expressão de desagrado após ver esse filme. Penso no quanto é válido assistir a duas horas e meia de filme para então concluir que o final deixou a desejar, não por que foi curto demais ou por que a direção é sofrível - porque isso não acontece aqui -, mas porque não há informações suficientes que permitam ao espectador montar em sua cabeça um “mapa” de como tudo aconteceu.

Apesar de bom em sua maior parta, o final deixa a desejar e, infelizmente, sendo o desfecho, no caso desse filme, a parte mais importante da trama, ficamos com a sensação de que não valeu a pena. Mas eu acho que vale que confiramos o filme, porque é uma das poucas adaptação que realmente encantam o espectador - mas, obviamente, eu recomendo que vocês leiam o livro antes ou depois, a fim de ver a diferença que faz a ausência no filme de Jane Marple perguntando à Hinch qual fora a entonação usada por Murgatroyd quando essa, antes de ser mais uma das vítimas, concluiu uma coisa extremamente importante: ela não estava lá. Na verdade, na entonação correta: ela não estava .

3 opiniões:

Unknown disse...

Oi,vim conhecer seu Blog,amei e já estou super seguindo,parabêns por seu cantinho e muito sucesso aqui!

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Rodrigo Mendes disse...

Não posso dizer o que acho desta adaptação Luís, ainda não conferi, mas o título é bastante convidativo e obra de Agatha Christie é sempre válido assistir. Verei se gosto ou não, vou procurar baixar.

Só sei que existe muito acervo bom da televisão, a maioria subestimada.

Ótima contextualização.
Abs.

Júlio Pereira disse...

Nossa, muito interessante. Nunca tinha ouvido falar de Convite Para um Homicídio - e que título, não? Tenho um livro da Agatha Chistie, chamado "O Misterioso Caso de Styles", mas até hoje, infelizmente, não li. Já leu esse? É bom?

Não sou muito conhecedor de telefilmes divididos em capítulos, apesar de grande admirador do recente Mildred Pierce. Do que vi, achei um formato interessante e este me parece utilizar bem o formato!

Bem, pra finalizar, das adaptações cinematográficas das obras literárias, assisti a citada, dirigida por Sidney Lumet. Mas, não escondo, nem sabia que era uma adaptação, assisti por ser do mestre! =P
E, aliás, adorei!