Brasil, 2001, 100 minutos. Drama.
Indicado ao Globo de Ouro na categoria Melhor Filme Estrangeiro.
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Os leitores desse Blog e aqueles que me conhecem sabem que somente há pouco comecei a me interessar por filmes que não pertencem ao padrão hollywoodiano de cinema. Isso me fez conhecer interessantes filmes franceses, mexicanos, espanhóis. O cinema nacional, do qual estive sempre tão próximo, apenas passou a integrar o meu circuito recentemente, junto com os filmes oriundos de outros países que não os Estados Unidos. E nessa minha busca por filmes diferentes, deparei-me com Abril Despedaçado, que, na minha opinião, é uma pérola nacional, daquelas que não se pode ignorar.
Hoje, o ator Rodrigo Santoro tem fama internacional, já tendo inclusive participado de muitas produções estadunidenses, como a sua polêmica participação muda em As Panteras: Detonando. Sua fama primeiramente provém das novelas globais, das quais (quase) sempre se destacou. No ano de 2000, estreou em seu primeiro longa-metragem, o aclamado Bicho de Sete Cabeças. Na época, eu era novo demais pra dar importância a esses fatos, mas o tempo passou e eu insisti em mantê-los na ignorância. Quando por fim vi este filme, o primeiro com o ator - estou desconsiderando sua presença em As Panteras -, descobri o porquê de tantos elogios para a sua interpretação: ele está simplesmente irrepreensível nessa produção.
Dou credibilidade às atuações de todos os atores do filme, desde os que aparecem mais aos que aparecem menos e realmente creio que é por causa da densidade de suas interpretações que o filme é tão bom assim. Os atores conseguem externar muito bem cada momento de emoção e cada sensação é demonstrada com eficiência, sem exageros, sem superficialidades. A composição de cada personagem é eficaz e todos, sem exceção, conseguem nos fazer compreender qual é o significado de todas aquelas mortes e o quão tênue é a linha que separa a dignidade da vingança. Embora todas as pessoas mostradas ao longo do filme tenham seu peso, a obra enfoca mais dois personagens, que são Tonho e seu irmão, chamado apenas de "menino". Rodrigo Santoro e Ravi, que estreou no filme após concorrer com vários outros garotos, estão excelentes e em nenhum momento suas atuações definham; a linearidade é sempre constante e isso nos permite concluir que esta é uma obra muito sólida não somente pelo roteiro, mas também pelo que vemos quanto ao desempenho dos atores em cena. Achei meio estranho o sotaque, porque realmente parece tão nordestino assim, principalmente se compararmos com inúmeras outras obras cujo cenário é o sertão nordestino. Não há como dizer que não há a variação linguística típica da região, pois isso fica muito claro no filme. Mas de um modo geral, o que vemos são sons diferentes daqueles aos quais nos habituamos. Compreenderão bem o que eu digo aqueles que já assistiram a esse filme e viram também O Auto da Compadecida e Caminho das Nuvens.
Poucas vezes vi num filme brasileiro um roteiro tão interessante quanto esse, pois, embora consigamos resumi-lo em três linhas - o que farei mais adiante -, ele é muito rico naquilo que mostra, já que engloba desde uma tradição horrenda até o amor fraternal, o relacionamento familiar tempestuoso e, por fim, o romance, ainda que bem sutil. A narrativa se dá início no ano de 1910, no mês de fevereiro, quando o filho mais velho da família Breves é assassinado por um membro da família Ferreira; o conflito acontece por causa das terras, que um dia pertenceram a uma família e depois a outra. Em abril, quando o sangue na camiseta do irmão mais velho amarela, Tonho sai de cada para ir retribuir o sucedido, matando com um tiro aquele que matou seu irmão. Isso faz com que Tonho passe a ter os dias contados. Acredito que esse filme mostre muito bem aquilo que é descrito em Vidas Secas, de Graciliano Ramos: o caipira é um bicho do mato, arisco, de poucas palavras, mas que pode, eventualmente, ser domado. As relações são praticamente essas, afinal Tonho reage à infâmia causada com agressividade; por dentro, no entanto, é completamente doce, alheio à qualquer violência. A união com seu irmão é tão grande que juntos eles se diferem totalmente da paisagem árida do lugar em que vivem, destoando as emoções do lugar em que estão.
O filme tem uma fotografia muito bonita. Se os atores não conseguissem repassar o quão desolada a área é, a fotografia certamente conseguiria fazer isso com eficiência. Nas cenas finais, quando tudo o que vemos é o moinho à tração animal, com a mãe jogada ao chão chorando, temos a certeza de que nada resta àquele povo a não ser a solidão e a miséria. Não por causa de suas ações, mas sim pelo meio em que vivem: dispõe de pouco, esforçam-se ao máximo e, no fim, morrem sem honra.
Sinceramente, eu não vi contras nessa produção, somente prós. Por isso, eu digo que Abril Despedaçado é um dos melhores filmes brasileiros. Walter Salles prova que sua carreira como diretor é tão sólida quanto o filme nos apresenta e, devido à isso, me sinto obrigado a elogiar muito a obra e a recomendá-la a quem quiser assistir a um bom filme nacional. Há algum tempo, um de nossos parceiros, Cetreus, o dono do Cinemótica, elaborou uma lista dos 10 filmes brasileiros bons e 3 lixos (que vocês podem conferir clicando no link); me surpreende que Abril Despedaçado não esteja entre os dez. Também fiquei surpreso com o posicionamento de Cidade de Deus, mas o espanto maior coube à não-inclusão do filme desse post à lista dele. Dizem que gosto é gosto e não se discute. Eu concordo e minha opinião vocês conferiram acima: esse é um filme que vale a pena.
Luís
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Quanto a esse filme, digo uma coisa com total certeza: Abril Despedaçado é o melhor filme nacional que já vi. Tudo no filme funciona bem. O enredo regionalista consegue prender a atenção, as atuações são excelentes e o cenário seco e triste adiciona mais um ponto positivo ao filme. Bem resumidamente, o enredo é assim: Duas famílias rivais vivem na mesma região. O histórico das famílias deve ter acontecido a muito tempo, mas o fato é que desde que um integrante de uma família matou um da outra, a família que ficou sem seu ente querido tem que mandar o irmão mais velho do falecido para vingar a morte do irmão, e é esse ciclo que se repete até chegar nas gerações que o filme narra. O interessante disso é a inevitabilidade. Todos os filhos do casal sabem que mais cedo ou mais tarde eles terão o mesmo fim do irmão.
O filme se passa no agreste nordestino brasileiro de1910 e só por isso conseguimos formar uma visão do filme. Seca, pobreza, tristeza e a forte rivalidade entre famílias são partes integrantes do filme. Além disso, há um forte tom religioso que por vezes se transforma em macabro como pode ser notado no funeral. O interessante é que esse apego religioso é mostrado de forma muito verdadeira (quem já foi em um terço em um sítio ou até mesmo em uma Folia de Reis sabe o que estou falando), principalmente levando em conta a região e a época que o filme retrata. Outro tom que se sobressai no filme é um lado naturalista onde a família de Pacu se mostra tendo apenas o básico para viver. Logicamente este fato está ligado a pobreza que eles vivem, e para ganhar dinheiro, eles tem que participar de todo o processo até a vender o produto final que eles produzem: a rapadura. Falando nisso, todo o processo de moer a cana é mostrado de forma tão peculiar no filme, que por vezes não sabia se admirava a cena que tem um tom de cor de areia com uma fotografia linda, com o contínuo girar da moenda e com os constantes gritos do pai incentivando os bois a andares; ou se me entristecia em ver aquela realidade, que provavelmente muitas pessoas ainda vivem.
A atuação é outra que transforma o filme em recomendável. Rodrigo Santoro (talvez o ator brasileiro de maior sucesso no exterior já que fez filme filmes como As Panteras Detonando e 300) está perfeito no papel de Tonho. Seu personagem passa um ar tímido e que tem muito medo da morte e ao mesmo tempo sabe que ela está cada dia mais próxima. Esse modo de comportamento dele é quebrado apenas uma vez quando foge, mas a honra da família é mais forte que ele sabe que terá que voltar. Outro que chama a atenção é Ravi que interpreta o irmão mais novo de Tonho. Pacu é apenas uma criança que ainda fantasia coisas imaginárias, mas também tem uma mente crescida que já conhece seu futuro.
Renan
História de um Crime: Colmenares
Há 6 minutos
13 opiniões:
Renan,
Acho digno descobrir o que os filmes nacionais tem de qualidade. Muitos ficam por dever aos nossos olhos, tirando a nossa vontade de ver filmes brasileiros pela falta de um roteiro legal, de um história boa. Mas outros muitos como este fazem nos orgulhar bastante de uma certa produção. o que é incrível para nós, até no mercado do cinema. :)
valeu pela dica, adorei o post.
bjos
Cara eu vi esse filme na faculdade, creio que em 2004 mais ou menos! Mas que filme em? Não teve o sucesso de Tropa, Cidade de deus, entre outros, as vezes acho que sequer foi o filme mais badalado do santoro, mas tb vejo esse e Naradores de Javé como os principais filmes brasileiros que já vi! Excelente texto!
well, nunca assisti esse filme, assumo que sou um zero a esquerda em relação ao cinema nacional, se muito vi 40 filmes de nosso pais rs
mas fiquei afim de ver esse, já assisti bicho de 7 cabeças com ele e acho genial!
É... Abril Despedaçado era o meu filme nacional predileto, até assistir a Céu de Suely, que tomou seu lugar!
É impressionante como Abril Despedaçado pode ser tão forte e ao mesmo tempo tão delicado, e comunicar tanto de emoções humanas, sem ter quase diálogo, não é?
Se tiver um tempinho, dá uma olhada no meu blog. Ele conta as aventuras de uma garota tentando sobreviver a essa droga de adolescência:
http://diariodeumagarotaemapuros.blogspot.com/
Já tô louca pra ver esse filme!!! Adorei seu blog e jah favoritei aki!!
bjooooo
Já faz um bom tempo que eu quero conferir este filme. Ainda vou assistí-lo!! Adorei a crítica, muito interessante.
Abraçooo!
Nossa esse filme é ótimo pelos comentários que já ouvi me deu muita vontade de assistir, e vou ver, com esses comentários fiquei com mais vontade ainda de ver.
BLOGdoRUBINHO
www.blogdorubinho.com.br
www.twitter.com/rubenscorreia
Abril Despedaçado é um filme brasileiro que eu ainda não pude conferir, talvez seja por isso que ele não esteja no TOP ;D Mas depois dessa sua paixão demonstrada pela obra, preciso vê-la para atualizar essa lista!
Quanto á pergunta de como eu meço os spoilers, é simples: eu seleciono momentos que eu não poderia revelar na postagem ( em UP foram 20 momentos )e escrevo o texto. Depois, eu vejo quais assuntos eu, inevitavelmente comentei ( em UP foram 8 momentos ) e depois faço uma relação e, porcentagem ( no caso, 40% . É um método fácil e certeiro, rs!
Abraços!
Sem dúvida é um ótimo filme, que mostra com realismo a vida e os costumes (lavar a honra com sangue) do nordeste no início do século passado.
As interpretações são de primeira.
Abraço
Meu filme nacional de cabeceira!
Taí, um filme q ainda ñ vi..mas um dia eu assisto!
Abs! Diego!
Abril Despedaçado é maravilhoso! Existe um livro também, sabiam? Já leram? Até hoje corro atrás dele. Se for tão bom quanto o filme... putz! Não foi à toa que ele foi indicado ao Globo de Ouro e ao BAFTA! Além de tudo isso, tem grandes atores do nosso cinema: O onipresente José Dumont e o talentoso Luiz Carlos Vasconcelos...
Abração!
KARINA, suas palavras estão em acordo com as minhas. E sugiro que você assista a esse filme.
RAFA, na minha oipinião, é esse tipo de filme que deveria ter destaque nos circuitos internacionais.
CHARLIE, se você viu cerca de 40 filmes nacionais, certamente viu mais do que eu! E eu preciso rever Bicho de Sete Cabeças...
GAROTA EM APUROS, nunca ouvi falar de Céu de Suely, mas vou vê-lo tão logo que eu puder.
BRANCA, obrigado mesmo!
JEAN, sugerimos que você realmente o veja, pois vale a pena...
RUBINHO, que bom que ficou com vontade de ver. Veja-o, vale a pena.
MARCELO AUGUSTO, você precisa, precisa, precisa ver! Certamente um dos melhores filmes nacionais. Obrigado pela explicação, bastante lógico e matemático o seu método, hein...
HUGO, concordo com você. Um dos poucos filmes nacionais para se ver duas vezes.
CRISTIANO, até agora, o meu também.
DEWONNY, veja-o. É um dos poucos filmes nacionais que realmente dá prazer de ver.
MARCELO A., não sabia que havia um livro! Normalmente, os livros costumam ser melhores do que os filmes neles baseados. Concordo com você: grandes interpretações!
Luís
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