17 de abr. de 2010

Um Olhar do Paraíso

The Lovely Bones. EUA, 2010, 130 minutos. Drama.
Indicado ao Academy Award na categoria Melhor Ator Coadjuvante (Stalney Tucci).
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O que impressiona a princípio nesse filme é o elenco. Curiosamente, dentre os cinco atores importantes da trama, quatro já haviam sido indicados e/ou ganhado um Oscar por interpretações bastante densas. Wahlberg, Weisz, Sarandon e Ronan já foram indicados e, esse ano, Stanley Tucci, o quinto "ator importante" recebeu sua indicação justamente por esse filme. A somar, há a direção do premiado Peter Jackson, que nos trouxe obras aclamadíssimas, como O Senhor dos Anéis. Considerando todo esse peso, não me restavam dúvidas de que esse seria um grande filme.

Depois de vê-lo, porém, concluí que não é tão grande quanto eu supunha que fosse. Ainda que tenha um potencial artístico expansivo, o filme peca em alguns pontos - principalmente no roteiro - e isso faz com que o seu brilho seja bem mais fraco. Mesmo assim, creio que seja uma boa obra. Aproveitando que comecei a falar sobre o roteiro, vou comentá-lo agora. O roteiro proveio do enredo de Uma Vida Interrompida: Memórias de um Anjo Assassinado, livro de Alice Sebolda, que chegou ao Brasil numa publicação da editora Ediouro em 2003. A história aborda a narrativa de uma garota de 14 anos que está em território intermediário, entre o Paraíso e a Terra. Morta por um vizinho, Susie Salmon começa a vigiar a sua família e acompanhar os acontecimentos que não pôde presenciar enquanto viva, podendo interferir em alguns eventos, aproximando-se dos seus familiares, fazendo-os quase perceber sua presença.

Narrado em flashback até um trecho e depois normalmente, o roteiro capta bem os dois horizontes: é mostrada com eficiência a estadia de Susie no plano intermediário e também as transformações pelas quais passaram a família da jovem. Não tenho certeza de como foi estruturado o livro, porque ainda não o li, mas o enredo não se foca unicamente no drama, abrindo espaço também para cenas mais cômicas, permitindo que assim haja certo equilíbrio entre o que é mostrado e como o público reage a isso. A esses dois quesitos, meus sinceros parabéns. Porém, há grandes problemas quanto ao que é exibido. Se a família da jovem a princípio provoca afeição no espectador, depois ela causa profunda confusão. Isso se deve principalmente à má construção da personagem de Rachel Weisz, que primeiro se mostra uma mãe prestatitva para depois mostrar-se completamente alheia e esvoaçante. Diante dos problemas que seu esposo e seus filhos menores enfrentam, ela simplesmente foge de casa e vai colher laranjas em algum pomar isolado. A simples presença disso no roteiro já assusta e, para piorar, Peter Jackson compôs essas cenas de maneira muito estranha, fazendo parecer que nenhum assassinato realmente aconteceu, como se a mulher simplesmente estivesse apaixonada por alguém ao ver a fotografia que carrega consigo. A somar aos defeitos, há o problema com o quesito "desconfiança". Nenhum personagem tem qualquer motivo para desconfiar de George Harvey: o sujeito é estranho e introspectivo, mas pessoas como ele estão em todos os lugares e nem por isso ficamos suspeitando que sejam assassinos. Talvez para encurtar a história, o argumento usado para que os personagens desconfiassem do vizinho é o "instinto". O erro talvez tenha sido criar tantas pessoas puramente instintivas, já que o pai passa a desconfiar, a filha mais nova, o cachorro também, talvez até o arbusto em frente à casa dos Salmon desconfie do vizinho...

O roteiro também não explicita o porquê de Susie ser meio egoísta: ela se comunica parcialmente com o pai, com o irmão mais nova e decerto tem possibilidades para fazer mais do que faz. No entanto, abstém-se de mostrar algo mais produtivo, fica brincando no Plano Intermediário com Holly (numa excelente referência à personagem de Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo) e quando esta mostra a Susie que ela pode ir ao Paraíso, a garota fica abobalhada e decide voltar para pertubrar a vida da família. Honestamente, eu esperava mesmo que o corpo de Susie fosse encontrado, para que o filme se finalizasse "plenamente", mas percebo que esse não seria o final ideal, já que é bastante hollywoodiano e pouco verdadeiro, já que é mais usual não encontrarem restos de pessoas desaparecidas. Assim, considerei o roteiro mediano.

A respeito das atuações, creio que a maioria dos atores estejam bem em seus papéis. Rachel Weisz, por exemplo, não tem qualquer destaque, mas isso é culpa de sua personagem - que é ridícula. A única coisa a seu favor é a sua beleza, mas mesmo assim isso não chega a ser uma qualidade, já que ela foi enfeiada boa parte do filme. Mark Wahlberg definitivamente não convence como pai desesperado. Convence como pai carinhoso, então está bem em 50% das cenas em que aparece. Fora disso, sua atuação é semelhante à de Sean Penn em Sobre Meninos e Lobos - ou seja, estranha. Susan Sarandon não tem qualquer função em cena, mas é engraçado vê-la, principalmente porque ela é o contraponto do tom dramático do filme. Parece bobagem a inserção de sua personagem, que é meio caricata às vezes, mas definitivamente ela traz uma beleza a mais para o filme, talvez por sua experiência como atriz. Muitos consideram as suas cenas um exagero, mas eu discordo. Stanley Tucci está bem como o vizinho perigoso, mas honestamente achei sua interpretação apenas correta. Porém, afirmo: achei válida a indicação. Parece contraditório, mas não é. Achei que o seu personagem requer pouco do ator, já que ele é bastante linear, sem grandes nuances ao longo do filme. De quem é o destaque do filme? A resposta é simples: Saoirse Ronan. Ela tem apenas quinze e já foi indicada ao Oscar e não me resta dúvida de que conquistará inúmeras outras indicações, já que seu talento é visível em poucos momentos em cena. Tanto como a menina amarga de Atonement como a dócil Susie de The Lovely Bones, Ronan atiça o espectador com sua adorável interpretação. Dona de um dos pares de olhos azuis mais expressivos do cinema, a garota dá um verdadeiro show em cena, seja em momentos dramático ou em momentos cômicos. Ainda não vi as outras indicadas a Melhor Atriz, mas realmente acho que ela poderia ter sido facilmente indicada.

Todos que já viram algum filme de Peter Jackson sabem que o seu cinema é embasado em elementos humanos interagindo com elementos computadorizados. Assim, sem ver o filme, já imaginamos que veremos alguns efeitos especiais cuja finalidade é ressaltar o conteúdo não obtido sem eles. Um Olhar do Paraíso não é exceção: momentos importantes do filme se passam no universo atormentado de Susie, onde ela sente as crises ocorridas no mundo terreno. Destaque especial para a cena em que o pai de Susie destrói as garrafas com barcos dentro, que ele costumava criar por hobby, e isso se reflete num acidente grandioso na praia onde Susie está.

Com muitos prós e muitos contras, Um Olhar do Paraíso é um filme mediano. Concordo que não seja imenso, mas não acho que mereça tamanhas críticas como tenho lido por aí. Existem erros nessa obra - alguns furos no roteiro bastante graves -, mas os elementos positivos quase compensam e no final, mesmo que não tenha visto uma obra-prima, o que vi me agradou. Desse modo, eu recomendo que vocês assistam a esse filme, porque garante entretenimento satisfatório.

Luís
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1 opiniões:

Jean Douglas disse...

Ao ler a sinopse de “Um Olhar do Paraíso” pude perceber que havia uma temática espírita. E apesar de não me identificar com a doutrina espírita, não teria como construir o enredo do mesmo sem um ‘toque’ dessa temática. Claro que não o encarei com olhos preconceituosos, tanto que o assisti.

Começo falando da cena que me deixou literalmente sem fôlego, que foi o momento em que Susie Salmon estava cara a cara com seu assassino, no ambiente em que ele construíra. Ali fica visível todo o potencial que Saoirse Ronan tem a oferecer à película, sem me esquecer também da “certa” atuação de Stanley Tucci.

Em relação às outras interpretações posso dizer que Rachel Weisz ficou “neutra”, Mark Wahlberg na “tentativa” e Susan Sarandon “Essencial”. A ideia de paraíso ficou absolutamente linda e tocante, com cores vibrantes em momentos de intensa alegria e tons sépia para os momentos de drama. E eu não poderia deixar de falar da trilha sonora, que me deixou encantado e surpreso. Digo surpreso porque uma das músicas que costumo ouvir estava na trilha, a canção “Song to the Siren” de This Mortal Coil. Absolutamente linda, além de ter se encaixado perfeitamente com a cena.

O ponto negativo que houve para mim, foi o péssimo desfecho do assassino de Susan. A morte foi pouco diante de tanta vida que ele destruiu. Deveria haver sofrimento e dor, enquanto vivo. No geral, adorei o filme. Me encantou, emocionou e DEVO recomendá-lo.

Um forte abraço!
Até mais.