15 de mai. de 2010

Cem Anos de Solidão

Cien Años de Soledad, 1967. 394 páginas (Editora Record). Drama.

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Já tinha ouvido falar desse livro, mas nunca me interessei em lê-lo. Considerada uma das mais importantes obras da literatura latino-espânica, Cem Anos de Solidão é um dos livros mais lidos e mais traduzidos. Cerca de 30 milhões de cópias foram vendidas e a tradução já foi feita em 35 línguas. Eu, por muitos anos, dei as costas a esse magnífico livro, tendo-o lido apenas recentemente. Se por um lado demorei a conhecê-lo, por outro acredito que o li no momento certo, absorvendo-o tanto quanto possível e depreendendo o seu conteúdo de maneira correta.

Cem Anos de Solidão narra a longa história da família Buendía, traçando uma linha cronológica que perdura sete gerações. Tem início com a criação de Macondo, uma pequena aldeia afastada de todos os lugares, quase infiltrada no pântano, onde vão morar José Arcadio Buendía e Ursula Iguarán, que são primos entre si. Assim, ocorre a fundação da aldeia que viria a se tornar uma vila, posteriormente uma cidade, até ser reconhecida internacionalmente; tal como a evolução do lugar, há a passagem das gerações, sendo substituídas aos poucos, sempre com novas idealizações.

Logo nas primeiras páginas, já começamos a perceber o caráter épico do livro pela maneira sutil como o autor usa o futuro do pretérito, costurando o meio do livro ao começo, fazendo alusões às partes que ainda virão; isso deixa o leitor curioso, esperando ansiosamente por saber que caminho toma o personagem até chegar à citação que o autor faz. O apego à essa ferramenta literária impressiona o leitor, que traça dois planos diferentes: o presente e o futuro. Paralelamente, porém ainda no começo, ocorre um flashback contando o que levou o casal de primos a ir para aquele lugar desolado e como surgiu a fundação de Macondo. É extremamente importante compreender que o livro é dotado de um realismo fantástico denso e que por causa disso muitas passagens podem parecer completamente irreais - como às vezes relamente são. Mas o caráter inventivo dado a determinados momentos da obra acrescentam um valor ainda mais intenso a tudo que ela mostra, desenvolvendo diversos temas, como o amor, a religião, as crenças e costumes, etc.

Acredito que o ponto que mais me fascinou no livro é a escolha dos personagens: a família toda é protagonista do enredo. Conforme os anos passam e novos membros se somam à família já consolidada, esses se tornam também principais, tendo a sua história contada e participando dos eventos que acontecem. O título já faz alusão à vida de todos, pois em algum momento, eles acabam tomados pela solidão, que perdura tristemente e o alaga até a morte. Gabriel Garcia Márquez aborda com uma eficácia extrema a solidão em seu livro e consegue mostrá-la de diversas maneiras, conforme o personagem que a sente. Uma das características de maior impacto é a forma como isso aos poucos transforma um personagem rancoroso em bondoso, a maneira paulatina como eles se entregam intensamente a tal sentimento a fim de se redimir de tudo o que fizeram quando mais novos. Isso fica muito visível com duas personagens, que são Fernanda, que se humanizou na solidão, e Amaranta, que usou uma atadura negra na mão até o dia de sua morte para punir-se com as lembranças do passado. Aqui quero comentar quão fortes são as mulheres desse romance: elas são dotadas de carinho e servidão; não se submetem, porém, aos seus maridos, mas servem aos seus próprios caprichos e vontades, tornando os seus desejos reais. Parelalamente, são capazes de aguentar os desaforos da vida, como um casamento fadado à destruição, já que se supõe que seja blasfemo, ou aguentam as peripécias de uma marido adúltero; ou ainda a ira de uma família que se nega a compreender que o amor é insensato às vezes. Eu realmente sugiro que absorvam o máximo possível das ações de Amaranta e da muito coadjuvante Petra Cortes, amante de Aureliano Segundo; perceberão nas entrelinhas atitudes extremamente desesperadas, ainda que sejam extremamente cabais quanto ao amor.

O que pode confundir o leitor é a intrincada árvore genealógica, que, como bem demonstrado por Úrsula, tende a se repetir conforme surgem novas gerações. Assim, o livro é um emaranhado de José Arcadios, Arcadios, Aurelianos, Úrsulas, Amarantas, Remédios, etc. Os nomes vão tornando a surgir, dando a impressão de um ciclo, uma revolução de pessoas exatamente iguais entre si que se relacionam com outras também iguais entre elas. O leitor menos atento pode se perder na trama, não compreendendo exatamente quem é quem; é claro que o fato de os personagens pertencerem a gerações diferentes auxilia na condução da linha narrativa, mas, eu admito, que às vezes é difícil se lembrar deles com eficiência. Eu mesmo tive que recorrer a uma imagem da árvore genealógica na internet para me lembrar do que aconteceu a um determinado personagem, que eu tive a impressão de simplesmente sumir no meio da história.

Esse é um livro que todos amantes da literatura devem ler, nem que seja o último livro que venham a ler! Mas eu realmente sugiro que o façam no momento certo, quando estiverem completamente abertos às diversas - e criativas - possibilidades de enredo. É um livro de proporções grandes, seja no peso do que é mostrado quanto em algumas características por si próprias. Se começarem a lê-lo e não se interessarem por ele até o fim do primeiro capítulo, fechem-no e tentem de novo um mês mais tarde. Insistam caso o desinteresse persistir; num determinado momento, o livro há de te entreter: será esse o momento certo para lê-lo. Mesmo que o marasmo perdure por muito tempo, não desista e sempre inicie a leitura outra vez, porque realmente vale a pena!

Luís

2 opiniões:

Marcelo A. disse...

Não é à toa que García levou o Nobel de Literatura. Não é à toa que essa é uma das obras mais lidas de todos os tempos. Não é à toa que Cem Anos de Solidão é o grande livro em língua espanhola, ficando apenas atrás de Cervantes e o seu Homem de La Mancha... Obrigatório. Essencial. É assim que eu defino o livro...

Não tenho comentado com frequência, mas você sabe que eu adoro esse blog. Bom te ver na velha forma...

Abração!

Luiza disse...

Meu livro favorito! *-*
É tão intrigante e interessante,não dá vontade de parar de lê-lo!E confesso que diversas vezes tinha retornar a alguns trechos,pois já não sabia qual personagem ou qual geração era referida! =D

Recomendo a todos!